REZENDE, Marco Antônio Penildo; LOPES, Wilza Gomes Reis. Arquitetura e construção vernácula com terra no Brasil In: NEVES, Célia et al. Arquitetura e Construção com Terra no Brasil. Tupã, São Paulo: ANAP, 2022, 251 p.: il. – (PPGARQ ; v. especial). cap. 1.2, p. 27-35. ISBN 978-65-86753-59-2. E-book.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Marco Antônio Penido Rezende - Graduação em Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 1987), Mestre em
Arquitetura e Urbanismo (UFMG, 1998), Doutor em Construção Civil (Politécnica/USP, 2003). Pós-doutorado
Programa Preservação Histórica, Universidade de Oregon, EUA (2010). Pesquisas, atividades de ensino,
extensão e publicações nas áreas de: arquitetura vernácula, técnicas construtivas vernáculas e antigas,
arquitetura de terra, técnicas retrospectivas, história das técnicas construtivas, sustentabilidade,
conservação e patologia das construções, restauração e revitalização arquitetônica e urbana, inovação
tecnológica na produção de arquitetura, interfaces tecnologia x arquitetura, história das técnicas.
Wilma Gomes Reis Lopes- Possui graduação em Arquitetura pela Universidade Federal de Pernambuco
(1978), Especialização em Urbanismo (1985) na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Mestrado
em Arquitetura, pela Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo - EESC/USP (1998) e
Doutorado em Engenharia Agrícola pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP, 2002), na área de
concentração Construções Rurais e Ambiência, com ênfase em materiais alternativos de construção. É
professora Titular do Curso de Arquitetura e Urbanismo, ligada ao Departamento de Construção Civil e
Arquitetura, Centro de Tecnologia, da Universidade Federal do Piauí (DCCA/CT/UFPI).
Para introduzir o tema de Arquitetura Vernácula no Brasil, os autores enfatizam a grande diversidade natural
e cultural que existe no território brasileiro, e a articulam com as várias soluções construtivas que refletem
os materiais disponíveis em cada local. Em seguida, são citados diversos autores que discorrem sobre o que
seria a arquitetura vernácula, assim como o que ela representa para além da materialidade. Chega-se à
conclusão de que existe uma relação intrínseca entre essa arquitetura e as construções oriundas do saber
popular, em que são utilizados materiais locais e há uma adaptação à paisagem do entorno. Ela interage
com o ambiente em que se encontra inserida, respeitando o clima, os materiais, tradições e identidade
arquitetônica do local, valorizando, dessa forma, a identidade cultural. Assim, a arquitetura vernácula pode
se configurar num caminho para a sustentabilidade das construções e das relações sociais e culturais. Os
autores ressaltam a riqueza da arquitetura vernácula brasileira, ao mesmo tempo em que lamentam a sua
desvalorização enquanto campo de estudos e a falta de conhecimentos específicos sobre o tema, que
acabam por generalizar ou fornecer informações insuficientes sobre esse universo multidisciplinar. Em
seguida, apresenta-se a arquitetura vernácula com terra, produzida no Brasil, considerando-se a
continuidade e as mudanças encontradas no seu uso. Aqui são mostradas quais técnicas construtivas e tipos de moradias são mais encontrados em cada região do país e porquê - quais foram as influências externas que levaram a esses desenvolvimentos. Nas regiões Nordeste, Centro-Oeste e em parte da Norte percebe-se a influência africana, com o uso de plantas quadradas ou retangulares, telhados com duas águas, coberturas vegetais e vedação de pau a pique e adobe. Na região Sul, as técnicas de construção com terra sempre estiveram associadas à influência europeia. A região Sudeste guarda um rico patrimônio de edificações construídas com adobe, pau-a-pique e taipa de pilão. As técnicas construtivas com terra, chegadas ao Brasil com os colonizadores portugueses e os africanos trazidos como escravos, foram basicamente a taipa de pilão, o adobe e a taipa de mão ou pau a pique, que predominaram no país. A partir disso, se conclui que a construção com terra, adotada desde o início da colonização em todo o território brasileiro, permaneceu e se desenvolveu quando e onde sua utilização foi confirmada pela experiência do solo e do clima e onde se dava a melhor adaptação ao meio. Os autores também descrevem como, a partir das mudanças sociais e econômicas, a introdução da produção do tijolo cerâmico levou ao crescente desuso das técnicas com terra nas construções, apesar de o adobe e o pau a pique continuarem presentes em várias regiões do país. No final do texto, são compreendidas as permanências e mudanças na construção vernácula no Brasil, com ênfase na taipa-de-mão e no adobe- cada um com suas particularidades. A difusão da taipa de mão no país devido à facilidade de sua execução, da transmissão do “saber fazer” e do aproveitamento de materiais disponíveis no local foi muito grande. Em relação ao adobe, foram observadas algumas particularidades, como, por exemplo, a maneira de executar a alvenaria através de diferentes tipos de assentamento ou o uso de estrutura em madeira e fechamento em adobe. A dimensão do adobe também é variável. Para concluir, os autores exaltam a importância do estudo e da preservação da arquitetura vernácula de terra, não somente como patrimônio construído, mas também a sua importância social e cultural. Além de possibilitar uma melhor qualidade de vida e o empoderamento das populações locais. fornece a mão de obra e conhecimento para a restauração das construções históricas de terra.
AGUIAR, Douglas. Revisitando Turner. Habitação Social e os Desafios da Cidade Contemporânea. Arquitextos, São Paulo, ano 11, n. 127.07, Vitruvius, dez. 2010.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Construção autogerida em meio urbano: espaços e técnicas
Dados sobre o autor(es) e obra:
Douglas Vieira de Aguiar possui graduação em Arquitetura pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), especialização em Planejamento Urbano (DPU / University College London, 1977/8), Mestrado (MSc / Bartlett School, University College London, 1987) e Doutorado (PhD by Research / University College London, 1991). Foi Secretário do Planejamento Municipal de Porto Alegre (1978-1988) e, desde 1988, é professor associado ao Departamento de Arquitetura da UFRGS.
O artigo trata da defasagem que existe no campo da arquitetura a respeito das habitações de interesse social. Segundo o autor, nos últimos tempos, pouco se avançou na compreensão dos espaços gerados em meio urbano pelos segmentos populares, visto que a tipologia concebida atualmente assemelha-se muito ao modelo habitação-dormitório que foi planejado para as casas operárias do século XIX. Diante de uma produção arquitetônica que segue distinguindo as funções trabalhar e habitar, o autor busca fundamentação nas ideias-chave trazidas pelo arquiteto John Turner para tentar compreender como no contexto pós-industrial os modos de vida populares se acomodam aos espaços. Assim, o artigo se estrutura através da análise de ocupações de surgimento espontâneo e planejado situadas em uma determinada zona da cidade de Porto Alegre, de modo que, ao tratar dessas localidades, os pensamentos de Turner são revisitados. Ao todo são estudados três casos: um loteamento irregular, a Vila do Tio Zeca, e dois conjuntos de habitações de interesse social produzidos pelos órgãos municipais, o Núcleo Progresso e o Núcleo Mário Quintana. A Vila do Tio Zeca é uma favela precária, com muitos barracos de chapa metálica e lata, que tem uma população marcada por catadores e separadores de lixo. O autor ressalta a boa localização que essas moradias apresentam na cidade, como também a conveniência das locações no terreno, correlacionando esses aspectos ao que Turner chamou de “supportive shack”. O autor também traz a expressão “comunal household” ao comentar a constância com que se viam lotes ocupados de forma comunitária nesse assentamento informal. O Núcleo Progresso apresenta uma mistura de sobrados geminados e casas térreas. Nesse caso, o texto assinala as imposições colocadas pelos órgãos municipais quanto às modificações nas moradias, especialmente aquelas que venham a alterar a estética das fachadas, como também as restrições relativas ao uso, proibindo os proprietários de realizarem atividades econômicas. O autor relaciona ambas as situações com o que Turner denominou de “the oppressive house”. O Núcleo Mario Quintana era, inicialmente, composto por um conjunto de lotes estreitos que continham pequenas casas térreas geminadas, que apresentavam possibilidade de expansão na parte frontal e na parte dos fundos da edificação. Atualmente, o local se encontra completamente transformado, o que fez o autor correlacionar a situação com a ideia de “progressive development house”, proposta por Turner, segundo a qual as habitações populares apresentam processos contínuos de desenvolvimento. Após o relato de cada caso, o autor pontua que quanto mais livre é o espaço de qualquer pré-concepção, mais ele se encontra apto a atender as necessidades atuais das moradias populares. A pesquisa também levou o autor a reafirma o pensamento de Turner sobre a produção espontânea da moradia. Segundo Turner, ela apresenta, naturalmente, uma variedade de técnicas e de configurações espaciais, que, em geral, são de baixo custo e com alto valor de uso. O autor finaliza destacando a importância desse arquiteto para o desenvolvimento do estudo da habitação social, alertando para o seu pensamento de que “a vida da habitação tem mais a ver com as instituições humanas do que com as tecnologias de construção”. O artigo conta com plantas e fotografias.
OLIVEIRA, Adriana Mara de Vaz; MONIOS, Mathias Joseph. Transgressão na arquitetura popular. In: Vitruvius. Arquitextos, fev. 2016.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Construção autogerida em meio urbano: espaços e técnicas
Dados sobre o autor(es) e obra:
Adriana Mara Vaz de Oliveira possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Católica de Goiás (1985), mestrado em História das Sociedades Agrárias pela Universidade Federal de Goiás (1999) e doutorado em História pela Universidade Estadual de Campinas (2004). Atualmente é professora adjunta II da Faculdade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás, ministrando o curso de Arquitetura e Urbanismo. É integrante do corpo docente do Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo - Mestrado Projeto e Cidade da mesma instituição. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Teoria, História e Crítica da Arquitetura e do Urbanismo, atuando principalmente nos seguintes temas: arquitetura, cidade, cidade contemporânea, projeto de arquitetura, história da arquitetura e da cidade, patrimônio e memória, teoria e crítica da arquitetura, cultura arquitetônica, memória e cidade, urbanismo.
O artigo trata da arquitetura popular e do envolvimento dos autores com o assunto. O texto expõe a escassez de informação que existe no campo da arquitetura brasileira em relação a essa vertente, uma vez que os interesses de estudo se concentram nas manifestações eruditas. Essa constatação, segundo o artigo, particulariza-se em Goiás e é fruto da dificuldade de compreensão da legitimidade dessas manifestações como objeto arquitetônico. Antes de relatar sua experiência, os autores distinguem o popular do vernacular na arquitetura brasileira. Para eles, o que distingue essas manifestações entre si são os aspectos ligados à contemporaneidade que estariam presentes na arquitetura popular, tais como a industrialização dos materiais de construção e a interferência da globalização nas ações do morar. Segundo os autores, no âmbito dessa arquitetura, identificam-se aspectos tradicionais que se imbricam com outros advindos da modernidade, especialmente os relativos ao desejo de personalização ou individualização da morada, afastando-se da tradição. Inicialmente, seus estudos se voltavam para a arquitetura vernacular goiana realizada sem o auxílio de arquiteto, mas, com o passar do tempo, sua abordagem foi sofrendo ampliações, acrescentando-se à análise aspectos ligados ao popular. Neste âmbito, onde há junção e sobreposição entre tradição e modernidade, ou seja, o das chamadas culturas híbridas, os autores deram início a nova pesquisa, a qual, até a feitura deste artigo, estava em andamento. Intitulada “Arquitetura dos sentidos: entre o vernáculo e o popular”, essa pesquisa volta o olhar para o conhecimento e o registro dessas expressões arquitetônicas em Goiânia. O artigo aborda alguns aspectos dessa pesquisa, principalmente no que se refere à arquitetura goianiense e à sua relação com o gosto. Essa arquitetura foi analisada como objeto kitsch, tomando-se o livro Arquitetura kitsch suburbana e rural, de Dinah Guimaraens e Lauro Cavalcanti, como referência em tal problematização. O texto apresenta essa obra e analisa o termo “kitsch”, discorrendo sobre o fenômeno de um modo geral e sobre como Guimaraens e Cavalcanti o adaptaram à realidade brasileira. Ao final, são tecidos breves comentários acerca das moradias catalogadas na pesquisa. Essa identificação priorizou casas populares mais antigas, nas quais foram averiguadas as permanências e as alterações da tradição vernácula goiana, mas tais informações não são apresentadas ao longo do texto. Foram também identificadas as moradias populares originadas de ocupações mais recentes e que se sobressaem pelo apego às tradições construtivas, pela representatividade dentro do conjunto e pela originalidade. Este segundo conjunto de moradias tem, no texto, uma abordagem maior, sendo discutidos os seus aspectos externos, principalmente aqueles relativos aos fechamentos frontais dos lotes, em termos de formas, materiais, cores, revestimentos e objetos decorativos.
JORGE, Pedro Fonseca. A Arquitetura Popular como Transição entre o Vernáculo e o Erudito – uma tentativa de definição dos diferentes contextos arquitetônicos de raiz não-erudita. In: Actas do 1º Colóquio Internacional de Arquitectura Popular. Arcos de Valdevez: Casa das Artes de Arcos de Valdevez – Município de Arcos de Valdevez, 2013.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
Pedro Fonseca Jorge é arquiteto, com graduação em 2001 e doutorado em 2012 pela Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto. Foi professor da Escola Superior Gallaecia, de 2012 a 2014, e é atualmente pesquisador da área de Arquitetura e Urbanismo Populares/Rurais no CES – Centro de Estudos Sociais, laboratório associado à Universidade de Coimbra, com o tema “Fenômenos de transformação da arquitetura popular”. O texto analisado foi apresentado no colóquio que consta da referência bibliográfica.
O autor menciona a idealização da arquitetura real a partir do Inquérito à Arquitectura Regional, publicado em 1961 com título Arquitectura Popular em Portugal. Em especial, quanto à arquitetura “não contaminada” por influências externas. A arquitetura contaminada não pertenceria nem à Arquitetura Erudita, nem à Arquitetura Sem Arquitetos. Muitos dos tipos caracterizados no Inquérito não se encontram mais na paisagem edificada portuguesa. O pressuposto se cumpriu – era um legado arquitetônico em extinção. O autor confronta os dados do Inquérito em Alcobaça, em 1961, período daquela investigação. Na região estudada, encontrou-se um tipo específico de habitação unifamiliar rural, constituído por caixa retangular, com cobertura de duas águas, orientada para a estrada, com uma entrada axial ladeada por duas janelas simétricas. No licenciamento feito nesta área à mesma época, porém, apareceram dois tipos: a casa simétrica e outro diametralmente oposto, implantado perpendicularmente à estrada, com o plano de uma das janelas mais avançado, cobertura orientada para os lados e um corredor longitudinal distribuindo cômodos de dimensões diferentes. A área e a posição dos cômodos revelam o que era quarto, sala, cozinha, etc. Estas obras licenciadas não são eruditas, pois não nascem da reflexão sobre o habitar e a forma em um “contexto acadêmico e prático”. São a apropriação e adaptação de outros modelos, talvez de origem erudita, a hábitos e modos de vida rurais. A ausência deles no Inquérito se deu por dois motivos. Um, relaciona-se ao fato de que a investigação objetivara registrar o que estava em desaparição, o que não era o caso dos tipos identificados no licenciamento. Dois, que eram consideradas malfeitorias, importação de uma arquitetura citadina, não adequadas ao local, que não se coadunavam com a imagem pretendida pelos arquitetos modernistas. A sua existência exige categorias conceituais que as definam, visto não se encaixar com facilidade nem na definição de erudito, nem na de popular. Se a arquitetura moderna (erudita) buscou se alimentar da popular, caberia o percurso contrário de uma arquitetura popular que se alimente da erudita. O autor acredita encontrar uma saída com o conceito de vernacular – relativo a construções identificadas com um local específico – e na investigação sobre como funciona a tradição na arquitetura. O tipo arquitetônico é de evolução ou sucessão lenta. As atualizações são diminutas, porém inexoráveis, fruto da experiência e da prática. A restrição da circulação de informação em uma zona específica, contribui para a quase permanência do tipo. A tradição não é a imutabilidade, mas a mudança sem radicalismo. O espaço físico e intelectual onde é produzida é limitado, sem uma cisão evidente. Os novos tipos que surgem são, assim, incorporados aos valores vigentes, e os valores do tipo anterior que permanecem são aqueles que ainda são pertinentes.
LEAL, João. Os Arquitectos em Contexto: tematizaçãos do popular no século XX português. In: Actas do 1º Colóquio Internacional de Arquitectura Popular. Arcos de Valdevez: Casa das Artes de Arcos de Valdevez – Município de Arcos de Valdevez, 2013.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
João Leal é mestre em Antropologia pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (UNL) e Doutor em Antropologia Social pela ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa. Foi, entre outras coisas, membro da Comissão para o Patrimônio Cultural Imaterial (2011-12) e co-fundador e diretor da Revista Etnográfica (1997-2003). É membro, desde 2013, do Conselho Nacional de Cultura. Atualmente, é professor da UNL, com pesquisas e artigos publicados nas áreas de Arquitetura Popular, Açores, Casas no Campo, Patrimônio Imaterial, e mais recentemente, de 2010 a 2014, conduziu pesquisa em torno do tema Ritual, Etnicidade, Transnacionalismo: as Festas do Espírito Santo na América do Norte. O texto analisado foi apresentado no colóquio que consta da referência bibliográfica.
O autor enumera as tematizações da arquitetura popular em Portugal. Pela Antropologia, com a obra de Ernesto Veiga de Oliveira; pela Geografia Humana, com a obra de Orlando Ribeiro, e pela Agronomia, com o Inquérito à Habitação Rural, dos anos 1940. Essa tematização, na Arquitetura, se divide historiograficamente em dois momentos: do final do séc. XIX até os anos 1950, em torno da casa portuguesa; e depois, nos anos 1960, em torno do Inquérito à Arquitetura Popular, que constituiu uma reação. O autor divide a discussão da casa portuguesa em duas etapas. Primeiro, o debate, na transição do séc. XIX ao XX, sobre a casa portuguesa, vista como a autêntica arquitetura do país, por figuras como Ricardo Severo e, principalmente, Raul Lino. Nesta etapa, ocorre a aceitação gradual dessas propostas. Nos anos 1920, com a ascensão do Modernismo e do Art Decó, houve retrocesso do tema da casa portuguesa – situação que o advento do Estado Novo, de início, não muda. A partir do final dos anos 1930, por conta da relutância do Estado Novo com o Modernismo, ocorre nova tematização da arquitetura popular, coincidindo com a edição de 1933 das Casas Portuguesas, de Raul Lino, e com os programas de habitação social e equipamentos públicos. Por sua vez, o Inquérito à Arquitetura Popular em Portugal teve impacto não em políticas públicos, mas em “lições” aos arquitetos. Havia denominadores comuns entre essas três tematizações: a importância da arquitetura popular; o seu perfil rural; e a possibilidade de encontrar aí a singularidade do país. Na idealização do Inquérito por Fernando Távora e Eduardo Keil do Amaral, através da análise funcional, buscava-se sair do beco sem saída de relacionar o tema ao pitoresco. No entanto, O Inquérito foi construído como uma contraposição, ponto a ponto, das propostas de Raul Lino, assim como, apesar do reconhecimento da adequação da arquitetura popular ao clima, geografia, economia, etc., à sua convergência com a Arquitetura Moderna. A descoberta do mundo da cultura popular soava-lhes como encontrar o país real, perpassado pelo sentimento do fim daquela cultura popular, com a invasão do mau-gosto urbano para a zona rural, em especial, representado pelas casas de emigrantes retornados. Na nova geração de pesquisas, vê-se o interesse pela arquitetura popular, com a valorização patrimonial e por meio de processos de gentrificação onde surge em residências secundárias da classe média ou em projetos de desenvolvimento turístico. Estaria ocorrendo, assim, o início de uma “segunda vida” da Arquitetura Popular, agora como exposição de si mesma, até mesmo pela diminuição da população rural. Também houve o declínio da crença de que no mundo rural estava a raiz, a identidade, da nação. A generalização da casa do emigrante, que se tornou um modelo produzido e concebido localmente para não-migrantes, expressa um “novo vernáculo”, segundo Nuno Portas, ou um “vernáculo moderno”, conforme Domingos Tavares.
MOREIRA, Maria da Graça. Aldeias Desertificadas e Alterações Funcionais: Aldeias de Idanha a Nova. In: Actas do 1º Colóquio Internacional de Arquitectura Popular. Arcos de Valdevez: Casa das Artes de Arcos de Valdevez – Município de Arcos de Valdevez, 2013.
Eixos de análise abordados:
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
Maria da Graça Moreira é bacharel e licenciada em Geografia pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, respectivamente, em 1978 e 1980, e Mestre e Doutor em Planejamento Regional e Urbano pela UTL – Universidade Técnica de Lisboa – em 1989 e 2002. Foi Professora Assistente na Faculdade de Arquitetura da UTL, de 1985 a 2002, e Professora Auxiliar no Departamento de Ciências Sociais e do Território, de 2002 a 2014. Atualmente, leciona no Departamento de Artes, Humanidades e Ciências Sociais na UTL, desde 2014. A autora é também pesquisadora do CIAUD – Centro de Investigação em Arquitectura, Urbanismo e Design da FA/UTL desde 2006. O texto analisado foi apresentado no colóquio que consta da referência bibliográfica.
A autora trata das alterações da organização funcional dos aglomerados urbanos do interior do país, com a desertificação demográfica e a mudança da estrutura econômica, dos anos 1960 até hoje. A partir dos anos 1950, houve o abandono das áreas rurais, processo que ainda segue, com diminuição da densidade populacional, envelhecimento da população e ruptura da organização funcional e espacial, dada as alterações tecnológicas e seus impactos, e devido a mudanças no setor público em serviços de suporte à população, como educação e segurança; no setor privado, às atividades comerciais e no setor produtivo, à decadência da agropecuária. A área estudada é a Beira Interior Sul, no Concelho de Idanha a Nova, mais especificamente, as aldeias de Salvaterra do Extremo e Toulões. A autora conclui que houve mudanças nas funções dos edifícios públicos, antes destinados à educação e, agora, voltados à saúde e segurança social para idosos. Desapareceram as funções mais importantes para os jovens, com a retirada dos serviços estatais de segurança interna e controle de fronteiras. Abandonaram-se, ainda, as instalações ligadas à pecuária. As únicas atividades comerciais estão ligadas à restauração, com a aparição de funções ligadas ao lazer da população urbana (turismo), em antigas instalações utilitárias. A arquitetura popular originária das atividades agropecuárias – como palheiros, moagens e lagares - ou foi abandonada, ou transformada em habitações, com a procura por pontos de melhor acesso a partir do exterior para novas atividades econômicas.
TEIXEIRA, Manuel C. Popular, Tradicional, Regional, Português, Nacional. In: Actas do 1º Colóquio Internacional de Arquitectura Popular. Arcos de Valdevez: Casa das Artes de Arcos de Valdevez – Município de Arcos de Valdevez, 2013.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
Manuel Teixeira é graduado em Arquitetura pela Escola Superior de Belas Artes de Lisboa (1975) e Ph.D. pela Architectural Association School of Architecture em Londres (1998). Fez Pós-Doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991) e Agregação em Arquitectura e Urbanismo pelo ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa (2002). É Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa e pesquisador do CIAUD da Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa. Atua nas áreas da História Urbana, do Urbanismo e das Morfologias Urbanas Portuguesas, Habitação Popular e da Arquitetura Popular. Seus livros mais recentes são A Forma da Cidade de Origem Portuguesa de 2012 e Arquitecturas do Granito, de 2013. O texto analisado foi apresentado no colóquio que consta da referência bibliográfica.
O autor aborda os primeiros autores a tratarem da arquitetura popular em Portugal. Rocha Peixoto defendia a habitação como resultado da adaptação sagaz a motivos concorrentes - os recursos geológicos, o clima, as necessidades sociais e domésticas. Leite de Vasconcelos estuda a habitação das regiões e sub-regiões do país, com plantas, fachadas, componentes da casa, detalhes da construção e materiais, mobiliário e utensílios. Amorim Girão crê que a influência primeira do meio se dá na matéria-prima, depois pelo clima, com relações mais visíveis na casa rural que é mais integrada ao ambiente. Mário Botelho de Macedo defende que a casa rural tradicional era um instrumento de trabalho do homem no campo e resultado da evolução lenta da experiência acumulada por gerações, associando-a ao verdadeiro caráter português. Orlando Ribeiro estabeleceu a distinção entre a civilização do granito e a do barro, entre o norte e sul de Portugal. Raul Lino defendia que as características da arquitetura portuguesa residiam na proporção, linha, volume e cor. Paulino Montez argumenta que a cultura define a arquitetura, idéia defendida também por Fernando Mercadal. O Inquérito à Habitação Rural, de 1943, coordenado por Lima Bastos e Afonso de Barros, foi feito para conhecer as condições econômicas e higiênicas dos agricultores e despertar os técnicos do governo para o problema da habitação rural. Nos anos 1950, houve o Inquérito à Arquitectura Regional Portuguesa, que defendeu a correlação com as condições naturais da região, o extremo utilitarismo, a rusticidade, a permanência e imunidade com relação à inquietação espiritual, porém omisso quanto às condições de vida da população e mesmo quanto às construções mais pobres no Litoral Norte, entendendo-as como sacrifício devido à extrema penúria. Entre os etnólogos e antropólogos posteriores, destacam-se Jorge Dias, Ernesto Veiga de Oliveira, Fernando Galhano e Benjamin Pereira, do Centro de Estudos de Etnologia, que definiram a habitação tradicional portuguesa como expressão dos modos de vida, das condições ambientais e dos materiais disponíveis, enfatizando a funcionalidade, a austeridade de recursos e formas, a harmonia formal e adaptação ao meio, a integração à paisagem circundante e sua caracterização, em continuidade civilizacional, sem rupturas. Fernando Távora e outros arquitetos envolvidos desenvolveram uma arquitetura contemporânea influenciada pela arquitetura popular. No início do século XIX houve mudanças sociais e econômicas, com a emigração para as cidades e outros países e o retorno daqueles bem-sucedidos e suas casas – as casas de brasileiros. A mudança mais radical ocorreu em meados do século XX, com a emigração das populações rurais e a conseqüente desertificação do campo e degradação de sua arquitetura, junto com a disseminação da cultura urbana e a substituição de antigos valores culturais por novas referências, a substituição dos materiais tradicionais por industrializados, por novas formas e proporções, por novos tipos arquitetônicos e novos revestimentos. Outra mudança foi a instalação de indústrias, comércios e serviços e um setor turístico rural. Assim como a arquitetura contemporânea que se instala, sem relação com a preexistente. No sentido contrário, a transformação de velhas edificações ou a produção de novos edifícios que visam retomar a arquitetura tradicional. Em seguida, o autor defende a reabilitação arquitetônica e o reaprendizado do conhecimento construtivo e compositivo que está em extinção.
ZANI, Antônio Carlos. Arquitetura em madeira. Londrina: Eduel, 2013. 397p.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Dados sobre o autor(es) e obra:
Antonio Carlos Zani possui Doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (1998), Mestrado em Tecnologia do Ambiente Construído pela Escola de Engenharia da Universidade de São Paulo (São Carlos) (1989) e Graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Farias Brito (1979). Professor Adjunto A (concursado em 2007), no curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Londrina e Professor do curso de Especialização em Projeto Arquitetônico, Composição e Tecnologia do Ambiente Construído, tem experiência profissional em Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Projeto de Edificações. Pesquisador da arquitetura regional em madeira com quatro livros publicados e sete capítulos de livros. Recebeu 9 prêmios e/ou homenagens.
Informações extraídas de: http://lattes.cnpq.br/6202079701421498
Sumário obra:
Introdução:
Arquitetura em Madeira no Paraná
As Construções de araucária no Sul e Centro Sul do Paraná no final do século XIX e início do século XX
A Predominância da Arquitetura em Madeira do Norte do Paraná nas décadas de 1930 a 1950
Cultura Arquitetônica Norte-Paranaense
Repertório Arquitetônico
Técnica e Sistema Construtivo
A Arquitetura dos Edifícios em Madeira
Casas Urbanas de Londrina
Capelas
A marca dos imigrantes Japoneses
A marca dos imigrantes Alemães em Rolândia
Tulhas de Café
Serraria Curotto
Resumo :
A obra trata da arquitetura em madeira produzida por migrantes e imigrantes no norte do Estado do Paraná, mais especificamente, do período que vai dos anos 1930 aos anos 1970. A colonização dessa região começou em 1920, com um projeto de cidades planejadas, composto de pequenas e médias propriedades rurais distantes até 20 km dos núcleos urbanos. Os imigrantes - em sua maioria italianos, alemães e japoneses - e os migrantes paulistas, mineiros e nordestinos, aproveitando a disponibilidade de madeira na região, a quantidade de carpinteiros no local e buscando satisfazer as suas necessidades, principalmente de moradia, mas também ligadas ao lazer e à religião, acabam por construir edifícios em madeira com soluções simples e com base nos princípios construtivos que cada indivíduo trazia de sua terra natal. As primeiras edificações erigidas foram provisórias, já que um desconto no valor do lote foi oferecido para aqueles que construíssem imediatamente as suas casas. Destacam-se três importantes momentos da ocupação dos imigrantes. O primeiro se inicia em 1930 e dura até meados de 1940. Ligado à representação da região como “Terra da Promissão”, tinha seus edifícios da zona rural e urbana em madeira, geralmente a peroba rosa, apresentando um caráter provisório e volumetria simplificada com pouco rigor estético. As exceções arquitetônicas estavam nos edifícios de imigrantes alemães e japoneses que possuíam tratamento plástico. O segundo momento, que vai dos anos 1940 ao final dos anos 60, se dá quando a região é caracterizada como “Eldorado”. A fusão dos saberes de migrantes e imigrantes unifica as técnicas e sistemas construtivos, gerando construções de caráter permanente e de alta qualidade plástica e construtiva. O terceiro momento, denominado “Fim do Eldorado”, corresponde aos anos 1970 e sinaliza a decadência da produção em madeira com qualidade e rigor, devido à escassez da matéria-prima na região. Analisando outras regiões do estado, como a sul e centro sul, nota-se que a ocupação data do século XIX, e que o material predominante era a madeira de pinho. No norte novo e na região noroeste (expansões da colonização do Norte) a ocupação se dá em 1960 e 1970 com predominância dos mesmos materiais e tipologia arquitetônica usada nas construções do norte. Já no oeste e no sudoeste, a arquitetura em madeira apresenta dois momentos: o primeiro, de 1930 a 1950, caracterizado pela expansão das serrarias do centro sul para exploração das matas de pinho, e, o segundo, nas décadas de 1960 e 1970, caracterizado pela exploração das terras para a agricultura. O autor considera importante analisar os aspectos compositivos das construções em madeira, ou seja, o volume e a superfície. O volume é determinado pelo conjunto arquitetônico: planta, telhado, varanda, porão (que usualmente servia de base) e a estrutura. No que concerne à superfície, há um destaque para o sistema vertical de tábua e mata-junta fixados com pregos, usado para vedação externa e interna e também destaque para os ornamentos rendilhados nos frontões, nas empenas e esquadrias. No último capítulo do livro, o autor destaca as casas urbanas de Londrina, construídas em madeira. Essas habitações possuíam quatro zonas básicas: estar, repouso, serviços e higiene. Na zona de estar, tem-se a varanda, o local de descanso, o hall de entrada, (espaços destacados pela rica presença de ornamentos), a sala, local de recepção e o local de acesso aos demais aposentos. A zona de repouso engloba dois ou três quartos, conectados entre si ou não, que se ligam à sala ou cozinha. A zona de serviço é o conjunto cozinha/área de serviço, podendo apresentar despensa. Essas áreas originalmente tinham mobília básica de materiais rústicos e, com a evolução dos equipamentos, sofreram alterações que reorganizaram os espaços e substituíram a madeira por alvenaria. A zona de higiene aparece como uma construção simples, de uma água, localizada no fundo do quintal com chuveiro, vaso e fossa. As casas possuem um programa simples de quatro plantas básicas, que podem sofrer variações e, assim, gerar variados tipos volumétricos. A ocupação do norte do Paraná foi pensada para que as cidades maiores funcionassem como suporte para as cidades rurais. Logo, pela grande distância e infraestrutura precária, foram construídos bairros rurais que atendessem às lavouras cafeeiras. Nesses bairros, as capelas, construídas em madeira, tinham um programa simples, com nave coberta por telhado de duas águas, altar e sacristia com telhados mais baixos. Mas, além disso, podiam apresentar mezanino, usado como coro e salão de festas e estruturas esportivas. A qualidade plástica dessas construções é dada a partir do programa, do partido e da composição das fachadas, com vedação de tábuas e mata-juntas, e pelo uso das cores. O sistema construtivo das capelas possui pórticos atirantados por cabos de aço e, ainda, uma viga horizontal chamada “estronca”, que fixa as tábuas de vedação. Os imigrantes japoneses construíram casas, kaikan (sede da associação), escolas e templos budistas. Nessas construções aplicaram elementos como o telhado irimoya, o guenkan (varanda ou hall de entrada elevado), e ornamentos como onigarawa (telha de ponta) e ranma (rendilhado). As casas urbanas adaptaram-se à planta padrão, volumetria e materiais usados, porém, o espaço interno e os ornamentos eram bem característicos, com um compartimento para banhos de imersão (ofurô) e símbolos no conjunto sala de estar/guenkan. Os imigrantes alemães se instalaram na região que é hoje o município de Rolândia, construindo escolas, clubes, hotéis e casas de comércio na zona urbana, além de sedes de fazendas cafeeiras na zona rural. A produção desses imigrantes marca o auge da arquitetura em madeira na região, destacando-se pelo tamanho e qualidades plásticas e construtivas já adaptadas ao modo de vida local. As residências se caracterizavam pelo uso do telhado em quatro águas, das tesouras atirantadas, do sótão, das janelas de canto, do peitoril com aparador, do revestimento interno formando parede dupla e pelo uso do mobiliário artesanal. As fazendas alemãs foram as mais representativas do período cafeeiro. A casa era implantada no espigão, permitindo o domínio da paisagem, e a colônia no fundo do vale, próxima a córregos. As tulhas e terreirões de café ficavam entre a sede e a colônia. O programa das sedes possui setor social, com salas e varandas, setor privado, com alas para os quartos, e setor de serviços. A técnica e o sistema construtivo são os mesmos das casas urbanas, com a diferença do emprego de tesouras atirantadas para viabilizar o sótão. A casa, monumental, divide as atividades em blocos distintos, com coberturas em águas inclinadas, conectados por varandas ou circulações e fachadas em tábuas de mata-junta. O programa das tulhas de café, segundo o tamanho e produção da propriedade rural, possuía espaços para estocagem, secagem, sistema de aeração natural e artificial. “O sistema estrutural é reforçado por uma trama de peças prismáticas, travadas externamente, através de sambladuras” (p. 357), podendo ser atirantadas por agulhas metálicas e vedação de tábuas e mata-junta na vertical, ou de tábuas macho e fêmea na horizontal. Desde o fim do século XIX até os anos 1970 houve grande ocorrência de construções em madeira em todo território paranaense, revelando uma cultura arquitetônica que aos poucos desaparece devido às demolições. Esse tipo de arquitetura sempre sofreu preconceitos, pois se acreditava que construções em madeira representavam atraso por ser um material barato e acessível. Leis restringiram esse tipo de construção desde 1905, como, por exemplo, em Curitiba, onde a construção de casas de madeira foi proibida nas ruas principais e, em seguida, em toda a região central da cidade.
JORGE, Pedro Fonseca. A arquitetura popular como transição entre o vernâculo e o erudito: uma tentativa de definição dos diferentes contextos arquitetónicos de raiz não-erudita. Actas do 1º Colóquio Internacional Arquitectura Popular, Arcos de Valdevez Portugal, 2016.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Dados sobre o autor(es) e obra:
Pedro Fonseca Jorge é formado em Arquitetura pela FAUP, (Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto), onde concluiu igualmente o Mestrado em Intervenção em Patrimônio e o Doutoramento em Habitação. Colaborou no Gabinete do Arquiteto Francisco Barata Fernandes e participou na execução dos projetos urbanos para o Porto 2001. Possui atelier desde 2001, por meio do qual realizou diversos projetos de habitação, serviços e recuperações. Escreve e publica regularmente sobre os temas do habitar e da recuperação arquitetônica.
Informações obtidas em: http://www.pedrofonsecajorge.com/bio/
Sumário obra:
Não se aplica
Resumo :
O artigo propõe uma definição dos termos arquitetura vernacular e arquitetura popular, de modo a lhes atribuir significado e desmitificar a ideia de verossimilhança entre eles. A arquitetura vernacular, segundo o autor, seria aquela que se limita a um local específico, não seria contaminada por influências externas e, claramente, se compatibilizaria com os fatores geográficos e físicos locais, e com o seu contexto sociológico. Logo, fica claro que a arquitetura vernacular possuiria um tipo arquitetônico único para cada ambiente e que proviria da tradição e da cultura de um grupo restrito. Esta arquitetura implicaria o uso de materiais de construção disponíveis no local e passíveis de adequar-se a agentes físicos atuantes na região. A arquitetura vernacular apresentaria, ainda, a característica de permanência do seu tipo arquitetônico, possuindo uma evolução tardia ou uma lenta sucessão do seu tipo, o que, praticamente, excluiria a expansão de suas técnicas e conhecimentos para além de suas fronteiras, bem como, a possibilidade de importação de novas técnicas. O tipo arquitetônico vernacular seria sempre estabelecido a partir de tradições ligadas a memórias romantizadas de um passado, próximo ou longíquo. Este tipo pode, segundo o autor, admitir mudanças, geralmente associadas a uma necessidade da população, mas essas mudanças não ocorreriam de maneira brusca, pois se trata de um ambiente de espaço físico e intelectual delimitado. Por vezes são atribuídos à arquitetura vernacular alguns falsos parâmetros, segundo o autor, sendo o primeiro a noção de primitivo e o segundo é a de ruralidade. Criar-se-ia, assim, a imagem de que a Arquitetura Vernacular é primitiva, em virtude da sua associação à tradição, contudo, a tradição admite evolução, ainda que lenta, porém que não equivaleria a uma estagnação. A ruralidade também seria, segundo Jorge, frequentemente associada à arquitetura vernacular, e isto se deveria à maior facilidade de se identificar um tipo arquitetônico bem definido no meio rural, no qual a sua evolução é gradual e sutil. Já na cidade, local de intensas trocas e de uma intensa comunicação, tornar-se-ia difícil o estabelecimento de um tipo arquitetônico dessa natureza. A arquitetura popular, por sua vez, seria aquela construída pelo povo, para o povo, construída, democraticamente, segundo o gosto do povo, dependente de uma escolha e realizada sem que haja a oposição de terceiros. Aquela, em suma, que herda sinais exteriores da cultura onde é gerada. Diferentemente, da arquitetura vernacular, a arquitetura popular não se baseia na tradição, não seria passível de ser identificada por uma fonte única ou por um período específico. Seria uma arquitetura que pode utilizar-se de “modas” ou tendências passageiras trazidas pela arquitetura erudita, ou seja, pela arquitetura moderna e contemporânea que se utiliza de características em vigor e de estrangeirismos, nascida de uma reflexão sobre o habitar e sobre a forma num contexto acadêmico e prático. A arquitetura popular, contrariamente à vernacular, se utilizaria de materiais novos, não propriamente locais e, ainda, de técnicas de trabalho mais elaboradas. Seria, portanto, uma arquitetura livre para adotar novas tipologias, lembrando o autor que não poderia ser classificada como erudita já que não importa signos dessa arquitetura, e sim lhe copiaria aspectos estéticos a fim de associar-se a um escalão social. O autor conclui que seria a diversidade tipológica a maior diferença existente entre as duas arquiteturas.
WEIMER, Günter. Adaptação da Arquitetura Popular Portuguesa aos Trópicos Sul-Americanos. In: Actas do 1º Colóquio Internacional de Arquitectura Popular. Arcos de Valdevez: Casa das Artes de Arcos de Valdevez – Município de Arcos de Valdevez, 2013.
Construção autogerida em meio urbano: espaços e técnicas
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
Günter Weimer é arquiteto, graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1963), mestre em História da Cultura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1981) e doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (1990). Atualmente é professor convidado do Programa de Pós-graduação em Urbanismo (PROPUR) da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase nos seguintes temas: arquitetura popular, história da arquitetura, imigração alemã, açorianos no Brasil e Rio Grande do Sul.
O autor acredita que a arquitetura popular, tema digno de estudo em Portugal, era “tabu” no Brasil pela baixa-estima quanto às origens da nação: os índios seriam selvagens; os negros africanos, igualmente depreciados; e a herança portuguesa, malquista nas duas “descolonizações” referentes à Independência do Brasil e à República. Como a vida familiar era cuidada pelas mulheres – nativas ou africanas – se o exterior da arquitetura mostrava-se lusitano, a presença de outras etnias se revelaria nesse âmbito. O autor busca então as contribuições dos “párias da sociedade colonial”. Dada a ausência de bibliografia sobre as realizações dos africanos, realizou quatro viagens à África, encontrando vasta variedade de arquitetura. Iniciou pela costa atlântica, junto com Moçambique, encontrando uma arquitetura muito bem adaptada aos trópicos, com edificações monofuncionais, separadas entre si, com ampla ventilação cruzada pela elevação do teto acima do acabamento das paredes, dispensando janelas. O emprego de amplos beirais na proteção contra o sol o leva a sustentar que as varandas brasileiras não teriam vindo do Extremo Oriente como se diz, e sim da África. Nos engenhos de cana-de-açúcar, as senzalas seriam transposições das sanzalas, nome quimbundo para uma forma urbana comum entre o norte de Angola e o Gabão. Como o quilombo, nome quimbundo para vila ou povoado, havendo a adaptação no Brasil para uma moradia “polifuncional” inexistente na África. Também as formações urbanas teriam reminiscências africanas nas tipologias arquitetônicas e urbanísticas. NO que toca à contribuição indígena, o autor parte de uma polêmica sobre a origem das casas subterrâneas encontradas no Rio Grande do Sul, com cobertura de matéria orgânica e base escavada no solo. Por ocasião da elaboração da Enciclopédia da Arquitetura Vernácula do Mundo, sob coordenação de Paul Oliver, encontrou soluções similares nos ainus das ilhas de Hokkaido e Sakalina. Lembrando que os povos mongólicos tiveram domínio sobre mais da metade das terras do globo terrestre, cogitou o parentesco dos índios Caingangues com aqueles ainus. Propõe um estudo filológico identificando os rastros das tipologias arquitetônicas, de um tipo que migrou do norte da Ásia pelas ilhas Aleutas, passando pela América do Norte e Central, a partir da literatura científica de cada lugar: soviética, norte-americana e latino-americana. Explana sobre a evolução da forma e material empregado, defendendo que na América do Sul os tipos se desenvolveram em diversas linhas, formando tramas paralelas e redes complexas. Apresenta algo do estado da arte da Arquitetura Popular no Brasil, com trabalhos sobre as construções de enxaimel dos imigrantes alemães, a transição das casas de pedra para as de tábuas dos imigrantes italianos, a produção em blokhaus dos imigrantes poloneses, as igrejas ortodoxas ucranianas, a arquitetura baixo-saxã dos produtores de laticínios holandeses. Observa que Portugal é um país estabilizado, com população equivalente a 5,4% do total da brasileira, num território que é 1% do brasileiro e, portanto, com densidade 5 vezes maior. O Brasil apresenta, para o autor, os extremos da humanidade, com uma população mais estável, como a negra, e outra móvel, como a indígena, e etnias muito variadas, em processo veloz de transformação, animadas pela herança portuguesa de “relativa tolerância étnica”.