TEIXEIRA, Manuel C. Popular, Tradicional, Regional, Português, Nacional. In: Actas do 1º Colóquio Internacional de Arquitectura Popular. Arcos de Valdevez: Casa das Artes de Arcos de Valdevez – Município de Arcos de Valdevez, 2013.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
Manuel Teixeira é graduado em Arquitetura pela Escola Superior de Belas Artes de Lisboa (1975) e Ph.D. pela Architectural Association School of Architecture em Londres (1998). Fez Pós-Doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991) e Agregação em Arquitectura e Urbanismo pelo ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa (2002). É Professor Catedrático da Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa e pesquisador do CIAUD da Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa. Atua nas áreas da História Urbana, do Urbanismo e das Morfologias Urbanas Portuguesas, Habitação Popular e da Arquitetura Popular. Seus livros mais recentes são A Forma da Cidade de Origem Portuguesa de 2012 e Arquitecturas do Granito, de 2013. O texto analisado foi apresentado no colóquio que consta da referência bibliográfica.
O autor aborda os primeiros autores a tratarem da arquitetura popular em Portugal. Rocha Peixoto defendia a habitação como resultado da adaptação sagaz a motivos concorrentes - os recursos geológicos, o clima, as necessidades sociais e domésticas. Leite de Vasconcelos estuda a habitação das regiões e sub-regiões do país, com plantas, fachadas, componentes da casa, detalhes da construção e materiais, mobiliário e utensílios. Amorim Girão crê que a influência primeira do meio se dá na matéria-prima, depois pelo clima, com relações mais visíveis na casa rural que é mais integrada ao ambiente. Mário Botelho de Macedo defende que a casa rural tradicional era um instrumento de trabalho do homem no campo e resultado da evolução lenta da experiência acumulada por gerações, associando-a ao verdadeiro caráter português. Orlando Ribeiro estabeleceu a distinção entre a civilização do granito e a do barro, entre o norte e sul de Portugal. Raul Lino defendia que as características da arquitetura portuguesa residiam na proporção, linha, volume e cor. Paulino Montez argumenta que a cultura define a arquitetura, idéia defendida também por Fernando Mercadal. O Inquérito à Habitação Rural, de 1943, coordenado por Lima Bastos e Afonso de Barros, foi feito para conhecer as condições econômicas e higiênicas dos agricultores e despertar os técnicos do governo para o problema da habitação rural. Nos anos 1950, houve o Inquérito à Arquitectura Regional Portuguesa, que defendeu a correlação com as condições naturais da região, o extremo utilitarismo, a rusticidade, a permanência e imunidade com relação à inquietação espiritual, porém omisso quanto às condições de vida da população e mesmo quanto às construções mais pobres no Litoral Norte, entendendo-as como sacrifício devido à extrema penúria. Entre os etnólogos e antropólogos posteriores, destacam-se Jorge Dias, Ernesto Veiga de Oliveira, Fernando Galhano e Benjamin Pereira, do Centro de Estudos de Etnologia, que definiram a habitação tradicional portuguesa como expressão dos modos de vida, das condições ambientais e dos materiais disponíveis, enfatizando a funcionalidade, a austeridade de recursos e formas, a harmonia formal e adaptação ao meio, a integração à paisagem circundante e sua caracterização, em continuidade civilizacional, sem rupturas. Fernando Távora e outros arquitetos envolvidos desenvolveram uma arquitetura contemporânea influenciada pela arquitetura popular. No início do século XIX houve mudanças sociais e econômicas, com a emigração para as cidades e outros países e o retorno daqueles bem-sucedidos e suas casas – as casas de brasileiros. A mudança mais radical ocorreu em meados do século XX, com a emigração das populações rurais e a conseqüente desertificação do campo e degradação de sua arquitetura, junto com a disseminação da cultura urbana e a substituição de antigos valores culturais por novas referências, a substituição dos materiais tradicionais por industrializados, por novas formas e proporções, por novos tipos arquitetônicos e novos revestimentos. Outra mudança foi a instalação de indústrias, comércios e serviços e um setor turístico rural. Assim como a arquitetura contemporânea que se instala, sem relação com a preexistente. No sentido contrário, a transformação de velhas edificações ou a produção de novos edifícios que visam retomar a arquitetura tradicional. Em seguida, o autor defende a reabilitação arquitetônica e o reaprendizado do conhecimento construtivo e compositivo que está em extinção.
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Rodrigo Reis Ollero das Neves é Professor Associado na Univesidade Lusíada de Lisboa. É Professor Regente da Unidade Curricular de Projecto I na Faculdade de Arquitetura e Artes da Universidade Lusíada de Lisboa. É, ainda, Coordenador dos Projetos de Investigação Os Materiais da Arquitectura e O Estuário do Tejo e as suas Áreas Ribeirinhas – estratégias para a sua sustentabilidade do Centro de Investigação em Território, Arquitectura e Design – CITAD. É PhD em Arquitetura pela Universidade de Salford, Reino Unido, com a Tese Letter to Raul Lino: cultural identity in Portuguese architecture: the "Inquérito" and the architecture of its protagonists in the 1960's, de 2001.
O artigo contém reflexões sobre o Inquérito à Arquitetura Regional Portuguesa – levantamento realizado pelo Sindicato Nacional de Arquitectos – SNA e publicado em 1960 – à luz da obra de Raul Lino e tendo como fio condutor a questão identitária em Portugal. O principal protagonista do Inquérito, Keil do Amaral, no texto preliminar intitulado “Uma Iniciativa Necessária”, propõe estudar a “arquitetura regional”, o que incluiria a erudita e a popular. Os exemplos citados neste texto, no entanto, pertencem à arquitetura popular. As equipes que se aprofundaram em distintos setores do país teriam seguido normais gerais que, sem delimitar taxativamente o que investigar, garantiriam a unidade global do trabalho, deixando margem de decisão às equipes. Houve ainda, registra Ollero, a vontade inicial de considerar o ordenamento das povoações. Embora tenha sido publicado como Arquitectura Popular em Portugal, ainda hoje a iniciativa é chamada de Inquérito à Arquitectura Regional Portuguesa, nome inicial do projeto. Tal dualidade não seria acidental e a indefinição conceitual subjacente à “arquitetura regional” não seria falta de maturidade, mas uma “estratégia deliberada”. Por um lado, justificaria melhor os vários apoios que foram solicitados pelo SNA e, por outro, evitaria a associação com ideologias calcadas no povo e, ainda, permitiria um vínculo com a “versão cultural ruralista” de Salazar. A maioria do Inquérito, contudo, versava sobre a arquitetura popular. Embora com menções à arquitetura erudita – como o Palácio da Pena, em Sintra; o Solar de Mateus, em Vila Real, e a Igreja de São Frutuoso de Montélios, em Braga – o grosso do trabalho se concentrou em edifícios tais como casas de lavoura, espigueiros, norias, etc. Ollero envereda, depois, na definição do conceito de identidade e no que a obra escrita de Raul Lino pode iluminar esse debate. Observa ainda a atenção dada pela geração de arquitetos modernistas, em Portugal e em outros lugares, à questão identitária na arquitetura popular, considerando-a racional, simples, expressiva e bela, ditada pela lógica econômica, funcional e construtiva. Em verdade, esse mergulho dos modernistas na arte popular teria se dado em vários campos. Entre os vários termos empregados para o tema - rural, popular, tradicional, folclórica, etc. – o autor aponta sua preferência por “popular”. Faz ainda menção ao desacordo quanto à inclusão das áreas urbanas, visto que seus parâmetros são distintos daqueles da arquitetura tradicional. Problematizando o termo erudito - já que nem todo arquiteto realiza obras com “sabedoria” edilícia – o autor propõe também a divisão da arquitetura entre erudita e corrente. Na erudita haveria a personalização do autor, que não se identificaria com o povo, ao contrário da corrente. Igualmente, na erudita seria frequente o abandono das tecnologias tradicionais. A diferença principal residiria, assim, na assimilação de aspectos culturais da sociedade. Na arquitetura popular essa assimilação ocorreria naturalmente, em continuidade com a prática construtiva; já na erudita, surge como aspecto intelectualizado e a matriz projetual, ainda que de origem vernácula, passa por elaborado estudo conceitual. Mas essa distância de procedimentos não implica em abismo formal, visto haver influências populares na produção erudita, justamente pela surpresa e virtualidades que a arquitetura popular apresenta. Isso explicaria os impactos do Inquérito na arquitetura erudita portuguesa.
RAMÍREZ PONCE, Alfonso. Arquitetura regional e sustentável.Arquitextos, São Paulo, 08.095, Vitruvius, abr 2008.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Alfonso Ramírez Ponce é arquiteto e professor mexicano, especializado em construções de baixo custo com materiais tradicionais como o adobe, o bambu, mas, em especial, o tijolo cerâmico comum. Possui diversas obras construídas em toda a América Latina, assim como premiações. É professor de Teoria da Arquitetura e do Ateliê de Projeto e Construção na Facultad de Arquitectura da UNAM – Universidad Nacional Autónoma de Mexico e do Seminário Ateliê de Arquitetura e Tecnologia na Unidad de Posgrado. É professor visitante em Universidades em todo o mundo, como a Politécnica de Cataluña, Espanha; a Universidad Nacional de Tucumán, na Argentina, e a Universidade de Cambridge, entre outras. Autor dos livros Habitar... Uma Quimera e Un pensamiento que se habita, e co-autor de vários outros.
Neste texto o autor discute o termo “sustentável” e se seria coerente utilizá-lo para a arquitetura ao lado ou no lugar dos termos “regional”, “indígena” e “vernacular”. Começa equiparando “arquitetura regional” e “arquitetura indígena”, definindo-as como arquiteturas que pertencem ao seu lugar, ou seja, que são originárias, próprias ou pertencentes a um lugar - inde (dali) e genus eris (origem, nascimento, raça). Segundo Ramirez Ponce, para que uma arquitetura possa ser assim considerada três aspectos devem ser observados: (1) o respeito à regionalidade cultural e social; (2) a adaptação das obras ao meio e (3) a forma e os materiais utilizados. Esta arquitetura estaria ainda dividida em dois tipos: uma autônoma ou vernacular e outra que o autor definie como “apropriada”. Esta última estaria sendo hoje também denominada de “arquitetura sustentável”, pois ao utilizar matérias primas locais e se aptar ao meio, cumpriria o requisito de utilizar materiais com baixo consumo de energia. O autor não considera, contudo, que o termo “arquitetura sustentável” seja o melhor, pois se articularia mais à idéia de firmeza e solidez do que à conservação do ambiente natural e ao uso racional e responsável dos seus recursos. Avalia, por fim, que o conceito de “arquitetura regional” ou “indígena” é mais amplo e contém tanto a idéia de arquitetura sustentável quanto a de arquitetura vernacular (ou a da arquitetura sem arquitetos). O termo regional ou indígena seria mais amplo e adequado porque implicaria a inclusão do fator econômico, da adaptação ao clima, à topografia e aos elementos existentes, naturais e artificiais, e à relação entre os espaços exteriores e interiores, com a conseqüente redução dos custos de construção, operação e manutenção.