MOUTINHO, Mário. A Arquitectura Popular Portuguesa. Lisboa: Editorial Estampa, Ltda, 3ª edição. 1995.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Mario Caneva de Magalhães Moutinho concluiu Antropologia Cultural na Université de Paris VII, em 1983 e leciona na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Publicou 33 artigos em revistas especializadas e 9 trabalhos em atas de eventos, possui 6 capítulos de livros e 12 livros publicados. Atua na área de Ciências Sociais e os termos mais frequentes na contextualização da sua produção científica, tecnológica e artístico-cultural são: Museologia, Urbanismo, Museu, Ecomuseu, MINOM, Estado Novo, Estudo Regionais Portugueses e Museulogia. A primeira edição da obra em exame é de 1979, Lisboa: Editorial Estampa.
A população, factores de distribuição e crescimento
Formas de povoamento
Actividades da população
A Arquitetura popular portuguesa
Região Norte
Região Centro- Litoral
Região do Alentejo
Região do Argarve
Cores dominantes
Localização das povoações citadas
Legendes des Ilustrations
Resumo :
Baseando-se na Introdução bastante vasta, de autoria de Jorge de Arroteia, que descreve as diferentes regiões de Portugal do ponto de vista geográfico, geológico e demográfico e as interferências dessas características nos fatores de distribuição, de crescimento e do modo de vida da população, o autor aborda a arquitetura popular portuguesa segundo quatro regiões arquitetônicas: Região Norte, abrangendo o litoral e o interior; Região Sul, abrangendo a região centro-litoral, a região do Alentejo e a do Algarve. O autor registra que estas regiões apresentam coerência ao nível das formas de povoamento, dos tipos de edificações ligadas à produção e das cores dominantes utilizadas nas construções. Esclarece também que as análises foram feitas principalmente a partir das habitações, sem, contudo, desprezar outros tipos de construção. Partindo dessas premissas, foram analisados e registrados os seguintes aspectos de cada região: tipos de povoamento, arruamentos, tipos de habitação, arquitetura de produção, arquitetura religiosa e as cores dominantes. Em geral, em todas as regiões levantadas, as habitações apresentam planta retangular ou quadrada, com um ou dois pavimentos e cobertura em duas ou quatro águas. A diferença entre elas encontra-se na distribuição do espaço interno, no número de pavimentos, nos materiais de construção e na relação da habitação com o espaço de produção ou de guarda de produtos como milho, feno etc. Foram identificados dois tipos de povoamentos: o disperso e o aglomerado. O primeiro está relacionado a construções de exploração agrícola familiar e o aglomerado é composto por pequenos grupos de habitações. Na região norte, o povoamento aglomerado é composto por habitações agarradas nos flancos das serras ou no alto dos morros e se apresentam de forma circular, em oposição aos de forma linear, frequentes nas regiões Centro-Litoral e do Alentejo. Na região do Alentejo o povoamento é do tipo aglomerado e geralmente formado por dois alinhamentos de casas separadas por um espaço denominado de terreiro. Existem dois tipos de habitação: monte alentejano e a casa povoado. Na casa monte alentejano o piso é em terra batida, lajes ou ladrilho e as paredes em taipa e tijolos, sendo algumas vezes reforçadas por contrafortes. As coberturas são de telhas, onde aparecem várias chaminés. A casa de povoado possui paredes de taipa e tijolos, rebocadas e caiadas de branco. Os tijolos são utilizados para a construção das abóbadas e chaminés. O telhado, de uma ou duas águas tem telhas assentadas em canas. Na região do Algarve, parte da população se dedica à horticultura, constituindo um povoamento disperso, marcado pela presença da casa rural. Contudo, também se registra o povoamento concentrado exemplificado pelas diversas aldeias dos pescadores. Apesar de diferentes, a casa de pescador e a casa rural do Algarve possuem um elemento em comum: a açoteia, ou terraço, que é acessível através de uma escadalocalizada no interior da habitação ou no pátio. A cobertura às vezes pode apresentar uma solução mista que congrega a açoteia e um telhado de meia água com pouca inclinação. Além de tratar das habitações, a obra também faz a descrição de alguns espaços de produzir, abordando principalmente as suas distribuições espaciais em relação às moradias e a algumas edificações religiosas. O livro é bastante ilustrado com mapas das regiões, fotos ilustrativas dos diferentes tipos de habitação e dos espaços de produção. Contém ainda plantas esquemáticas relacionadas as distribuições espaciais.
RIBEIRO, Orlando. Açoteias de Olhão e Telhados de Tavira (Influências orientais na arquitetura urbana). In: RIBEIRO, Orlando. Geografia e Civilização – temas portugueses. 1ed. Lisboa: Livraria Letra Livre, 2013, p.79-215.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Importante geógrafo português, Orlando da Cunha Ribeiro (1911-1997) foi um dos responsáveis pela renovação da Geografia no país, e tem como obras principais Arrábida, esboço geográfico e Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico. Não há informação precisa sobre a data da primeira edição da obra em que se encontra o estudo em exame. Esta é uma edição fac-similar da sua 1ª edição publicada em 1961, em Lisboa, pelo Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa/ Instituto de Alta Cultura.
Resumo :
Neste estudo, Ribeiro ressalta a cobertura como um dos elementos mais característicos da aparência das casas, descartando o determinismo climático estrito como causa de sua forma. A região do Algarve é estudada pelo autor como forma de ilustrar essa tese, pois, além de possuir zonas com características ambientais distintas, é a região em Portugal com maior variedade de telhados. Nela, destaca as “açoteias” sobrepostas (ou terraços) de Olhão e os telhados inclinados de quatro águas de Tavira como provas da absorção de trocas culturais, não necessariamente adequadas ao clima. No litoral oeste e na serra do Algarve, contudo, predominam telhados de uma só água. As construções acompanham terrenos em declive, mas com piso nivelado e sem pátio. Quando agrupadas, têm alturas desencontradas, encastrando-se umas às outras e criando uma variedade pitoresca. Barrotes fortes e compridos sustentam a cobertura. O Alentejo é escasso de árvores e, por isso, esses telhados de possível procedência berbere ocorrem mais na serra. A açoteia da casa rural é pavimentada com ladrilho, rodeada por platibanda baixa e usada, geralmente, para secar figo e alfarroba, podendo também servir para recolha de chuva para cisternas. O acesso se dá por escada interior e portinha, por escada exterior lançada sobre arco ou rampa ou por escada móvel de madeira encostada na platibanda. São comuns no Algarve e no Alentejo, mas como cobertura exclusiva surge somente no Olhão e na aldeia vizinha de Fuzeta com arranjo invulgar: um mirante também dotado de terraço, platibanda e acesso por escada exterior. Às vezes, acima deste, pode haver um “contra-mirante” com terraço ainda menor. Além da secagem de frutas, roupas e pescados, a açoteia serve também como depósito e, sobretudo, mirante para observação da saída e chegada de barcos. Ribeiro avalia que este arranjo proviria de influência moura ou oriental, já que seus pescadores, os mais hábeis do Algarve, que viviam em “palhotas” e navegavam pelo Marrocos e Mediterrâneo. No século XVIII, palhotas foram substituídas por casas de pedra, formando-se uma trama “mourisca” de ruas estreitas e irregulares, sem povoação muçulmana prévia, que indicaria transferência de usos, por imitação, sem influência do clima e reforçada por relações frequentes. Tavira, por sua vez, é originária do século XIII e seus telhados, feitos pelos artífices locais, são de açoteia; com platibanda; “telhados de esteira”, de duas águas, pouco inclinado e com revestimento interno de caniço; e o “telhado de tesouro” que, presente na maioria das casas, possui quatro águas muito inclinadas e telha de canudo, cobrindo apenas um cômodo. Ribeiro localiza as origens deste último nas possessões orientais do Império Português, pois existiriam em cidades portuguesas como Goa, Columbo, Dio e Malaca. O tipo, que teria absorvido dos hindus a forte inclinação, a quebra da baratelha e o uso de um telhado para cada corpo da construção, existe também em Luanda testemunhando a viagem entre Algarve e Oriente. A variedade de coberturas do Algarve se daria, assim, por sobreposição de influências pré-romanas, romanas, berberes e orientais somadas ao ajuste à geografia e economia locais. No entanto, algumas contradizem a “ecologia” como em Olhão – onde o clima não induz às açoteias – e Tavira que, em clima distinto, assimilou uma tipologia de áreas de monções.
RIBEIRO, Orlando. A Civilização do Barro no Sul de Portugal (Aspectos e Sugestões). In: RIBEIRO, Orlando. Geografia e Civilização – temas portugueses. 1ed. Lisboa: Livraria Letra Livre, 2013, p.47-78.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Importante geógrafo português, Orlando da Cunha Ribeiro (1911-1997) foi um dos responsáveis pela renovação da Geografia no país, e tem como obras principais Arrábida, esboço geográfico e Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico. Não há informação precisa sobre a data da primeira edição da obra em que se encontra o estudo em exame. Esta é uma edição fac-similar da sua 1ª edição publicada em 1961, em Lisboa, pelo Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa/ Instituto de Alta Cultura.
Resumo :
Portugal, sem velhas civilizações para dar-lhe elementos essenciais, é, em larga medida, condicionado pela sua extensão no sentido dos meridianos. A precipitação maior ao norte do Tejo, no sopé da Cordilheira Central, proporciona aspectos que avivam o contraste com o sul: bosques de folha caduca e matagais de folha perene; prados e pastagens de charnecas ou de restolhos; a área de gado grosso e de gado miúdo; o boi como único animal e o muar e o burro como concorrentes. Ao norte, população densa e isolada pelo relevo, com arcaísmos pré-históricos. Ao sul, a difusão de elementos civilizatórios oriundos da bacia do Mediterrâneo. No primeiro, surgimento de rocha sã e destruição dos depósitos de argila; no outro, clima seco e aplanações que conservam a argila. Nesta última região, aparece uma “civilização do Barro”, presente no Alentejo, com prolongamentos no Ribatejo e sul da Beira e na região da Ria de Aveiro, nos arredores de Leiria. No Alentejo, a taipa é usual nas paredes das casas e nos muros que resguardam os “ferragiais” e as hortas, sendo constituída de mistura de barro e pedriça, batida a malho dentro do taipal – caixa de madeira sem fundo que corre lateralmente e sobe à medida que endurece a parede. As paredes são rebocadas e caiadas, dificultando o reconhecimento do material, denunciado apenas pela ausência de molduras nas portas e janelas. A taipa foi ainda empregada na expansão portuguesa na África e América, com provável predomínio de gente do Sul. No Brasil foi suplantada pelo " pau-a-pique” ou “taipa de sopapo”, trazida pelos escravos, técnica menos duradoura porém mais rápida e simples. Também se emprega o “adobe”, barro amassado junto com areia ou palha cortada, moldado em tijolo e seco ao sol, sobreposto em fiadas com juntas desencontradas. Ambas as técnicas precisam ser conservadas da umidade: no campo, os muros são cobertos de pedra, palha ou telhas; nas casas, rebocados e caiados, protegidos pelo beiral do telhado. Há uma correspondência com a disponibilidade do material, oriundo de película de alteração superficial dos xistos argilosos, de bancadas discordantes sobre maciço antigo ou de camadas das bacias sedimentares do Tejo ou do Sado. Quase sempre, se encontra perto a pedriça miúda - fragmentos de xisto, de quartzito ou de quartzo de filão. Seu emprego é diverso: em arcos, abobadilhas e abóbadas de berço ou de aresta, coberta por um telhado sobre desvão ou por terraço ladrilhado, e em frisos de cimalhas, ameias, chaminés, pombais, arcos rendilhados, fornos. O barro comparece também na cerâmica: a originalidade alentejana está no seu uso para vasilhame de líquidos – “talhas” ou “potes” -, enquanto no resto de Portugal se usam pipas e tonéis de madeira. Além disso, nas salgadeiras de barro para carne de porco e nas peças para azeitonas. O centro de difusão dessa civilização estaria nos planaltos castelhanos com grande abundância de argilas e margas terciárias, e sem pedras disponíveis. Tal civilização, espraiando-se em Portugal, suplanta a civilização megalítica alentejana, das maiores necrópoles dolmênicas, desdenhando o material que a natureza oferecia.
Biblioteca da Universidade Federal do Espírito Santo
Referência bibliográfica:
MATEUS, João Mascarenhas. “Nomadismos das culturas da terra, da pedra e da madeira. Um tema fundacional da história da construção luso-brasileira” In: RIBEIRO, Nelson Pôrto (org). Subsídios para uma história da construção luso-brasileira. Rio de Janeiro: Pod Editora, 2013, p. 29-43.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Dados sobre o autor(es) e obra:
João Mascarenhas Mateus é ínvestigador do Centro de Estudos Sociais, Núcleo de Cidades, Culturas e Arquitectura da Universidade de Coimbra, Portugal. Licenciado em Engenharia Civil, fez o Mestrado em Ciências da Arquitetura na Katholieke Universiteit Leuven, Bélgica, onde trabalhou como assistente de investigação (1993-1995). Realizou na Universidade La Sapienza de Roma, Itália a investigação de doutoramento sobre a utilização de técnicas tradicionais de construção de edifícios de alvenaria na atividade da conservação arquitetônica. Foi "Cultore della materia" na Faculdade de Arquitetura Valle Giulia da Univ. La Sapienza de Roma (2002-2004) e é colaborador científico da “Scuola di Specializzazione in Conservazione dei Monumenti” da mesma Universidade, desde 2002. Organizou em 2010 a Primeira Conferência sobre História da Construção em Portugal e foi um dos coordenadores do I Congresso da História da Construção Luso-Brasileira (2013).
O autor realiza interessante revisão bibliográfica dos estudos portugueses e brasileiros sobre arquitetura popular e sistemas construtivos a partir da segunda metade do século XIX, avaliando, nos dois países, como foram apropriados para articular construção tradicional e identidade nacional, como influenciaram a produção arquitetônica em determinados períodos e geraram linhas para identificação de “uma genealogia” dos principais sistemas construtivos utilizados. Sobre Portugal, informa-se que os primeiros estudos etnográficos (1870-1890) foram integrados a investigações sobre tradições populares e voltados para a definição de uma identidade portuguesa – linha que caracterizou por muito tempo os estudos sobre habitação e arquitetura popular. Gradualmente, contudo, abandonou-se a ideia de uma “casa portuguesa”, reconhecendo-se a diversidade etnográfica do país e a adaptação das construções ao clima e às características da paisagem. Inicia-se então uma abordagem mais “relativista”, vinculada ao conceito de “nomadismo artístico”, conforme proposto por João Barreira em 1928, que buscava explicar as influências africanas e asiáticas na arte e na construção manuelina. Apesar desses avanços, até os anos 1950, predominaram estudos tipológicos que buscavam demonstrar o caráter nacional da arquitetura portuguesa. Paralelamente, levantamentos sistemáticos dos principais sistemas construtivos foram realizados, obtendo-se uma visão completa das culturas construtivas do país. A partir de 1920, esses estudos foram utilizados politicamente para a afirmação da arquitetura portuguesa como símbolo da nação, fundamentando programas governamentais de produção habitacional. O movimento “Casa Portuguesa”, que buscou articular essas características à nova construção em concreto armado, inicia-se nesse momento, contemporâneo do movimento Neocolonial brasileiro. Este último, ao afirmar uma identidade construtiva brasileira integradora de influências portuguesas, africanas e indígenas, teria deflagrado, no Brasil, estudos sobre como o ensaio Construções de Taipa (1946) de Carlos Borges Schmidt e outros como Arquitetura Brasileira – Sistemas Construtivos (1950-51) de Sylvio de Vasconcellos. O autor localiza nesses movimentos o início do diálogo que buscou identificar traços arquitetônicos comuns aos dois países e de onde brotará, mais tarde, uma fase madura de investigação. O artigo desenvolve ainda uma genealogia dos estudos brasileiros sobre o tema, identificando-se o seu início em 1839 nas investigações do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro sobre os povos ameríndios, e o seu desenvolvimento no século XX com os artigos de Gilberto Freyre e Wasth Rodrigues publicados na Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, bem como com os trabalhos de Robert Smith e Sylvio de Vasconcelos. Uma abordagem “madura” teria surgido em Portugal nos anos 1960, ressaltando-se A Arquitectura Tradicional Portuguesa (1992), de Ernesto Oliveira e Fernando Galhano, como a obra mais relevante, além dos escritos de Orlando Ribeiro. As investigações contemporâneas que focalizam aspectos tecnoló gicos e socioeconômicos da arquitetura vernácula em Portugal e no Brasil decorreriam desses estudos, mas Mateus aponta a necessidade de retomada das abordagens etnográficas e geográficas, já que o estudo dos grandes saltos tecnológicos não daria conta de caracterizar essa produção. Conclui que as culturas construtivas portuguesa e brasileira não “pertencem” a esses países, sendo resultado de nomadismos e contaminações recíprocas entre influências ibéricas, mediterrâneas, africanas, asiáticas e americanas.
DAVIS, H. The Culture of Building. New York: Oxford University Press, 2006, p.5.
FREYRE, Gilberto. Um estudo do Prof. Aderbal Jurema. Cadernos de Província 14, 1954.
MATEUS, João Mascarenhas. Técnicas Tradicionais de Construção em Alvenaria. Lisboa: Livros Horizonte, 2002.
MESTRE, V. La construcción tradicional en el espacio mediterrâneo portugués. Apuntes 20 p. 278-285.
MORLEY, Jane. Building Themes in Construction History: recente work by the Delaware Valley Group. Construction History Vol. 3: 13-30, 1987.
OLIVEIRA E. e GALHANO, F. Casas esguias do Porto e sobrados do Recife. Arquitetura Tradicional Portuguesa. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
PEIXOTO, R. Etnografia Portuguesa. Habitação. Os Palheiros do Litoral. In: Estudos de Etnografia e Arqueologia. Câmara Municipal de Póvoa do Varzim, I,: 70-88, [1899], 1967.
PEIXOTO, R. A Casa Portugueza. In: Estudos de Etnografia e Arqueologia. Câmara Municipal de Póvoa do Varzim, I,: 153-165, [1899], 1967.
SEVERO, Ricardo. A Arte Tradicional no Brasil: a casa e o templo – 1914. In: Conferências 1914-1915. São Paulo: Sociedade de Cultura Artística: Tipographia Levi, 1916, p. 43-44.
ISBN ou ISSN:
978-989-8268-16-7
Autor(es):
Orlando da Cunha Ribeiro
Onde encontrar:
Acervo Prof. Daniel J. Mellado Paz
Referência bibliográfica:
RIBEIRO, Orlando. A Civilização do Granito (Elementos para o seu estudo). In: RIBEIRO, Orlando. Geografia e Civilização – temas portugueses. 1ed. Lisboa: Livraria Letra Livre, 2013, p.17-45.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Importante geógrafo português, Orlando da Cunha Ribeiro (1911-1997) foi um dos responsáveis pela renovação da Geografia no país, e tem como obras principais Arrábida, esboço geográfico e Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico. Não há informação precisa sobre a data da primeira edição da obra em que se encontra o estudo em exame. Esta é uma edição fac-similar da sua 1ª edição publicada em 1961, em Lisboa, pelo Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa/ Instituto de Alta Cultura.
Resumo :
O traço marcante no norte de Portugal seria a maestria no manuseio do granito, onde estão disponíveis também o quartzito e o xisto. O quartzito é muito duro, pesado e difícil de trabalhar. O xisto, por sua vez, é retirado em lascas e usado como cobertura e revestimento, mas sem aparecer em grandes blocos resistentes. O material preferencial é o granito, empregado nos cunhais e lintéis mesmo nas casas que utilizam xisto, e usado em blocos em construções travejadas sem argamassa e sem aparelho miúdo. As maiores pedras são empregadas nos lintéis das portas. No Minho, aparece como “paleta” (bloco retangular em fiadas desencontradas); “pasta” (pranchas utilizadas nos muros e vedações com juntas de reboco caiado); “esteios da vinha” (talhado de modo retilíneo). É usado ainda em muros de pedra solta nas “bouças”, onde crescem os pinheiros e carvalhos; nos “lameiros”, lugares de pastagem e corte de feno; nos taludes, chamados “canteiros” ou “arretos”; nas “poldras” e “pontões” para a travessia de regatos e ribeiros; nas calçadas de grandes lajes das ruas e largos e no calcetamento de paralelepípedos nas estradas principais; em utensílios, como nós, pedras de lagar e salgadeiras. O ápice da arte estaria no “espigueiro” ou “canastro” para armazenamento de milho, anexo inevitável da casa rural. O Norte e o Sul de Portugal contrastam entre si, respectivamente, como civilização do granito e civilização do barro. A arquitetura de pedra, dependendo da sua natureza, lança mão dos calcários no litoral e do granito no maciço antigo, mas sem subordinação extrema ao material. Apesar de utilizado pelos romanos, o granito já era encontrado em ocupações anteriores, os “castros” – povoações implantadas nos montes com muralhas de aparelho miúdo e irregular, casas redondas de aparelho regular helicoidal e choças redondas para abrigo do gado e resguardo de instrumentos agrícolas – mas com uso distinto daquele da civilização megalítica anterior ou mesmo contemporânea. Conclui-se o texto com o estudo de Carvela, aldeia com aspecto “megalítico” - casas construídas com blocos maiores que o usual, fornos com grandes pedras afeiçoadas, lameiros cercados por lajes com até dois metros de altura - e próxima de uma das mais importantes necrópoles neolíticas do país, cujos dolmens foram em parte destruídos pelos construtores da região. Indica-se pesquisa que confirme em região com aldeias similares, como a serra do Brunheiro, se há pedras atuais que possam ter sido esteios de dolmens e locais onde ainda se afeiçoem lajes da mesma forma. O autor acredita que o próprio ambiente montanhoso é fonte de arcaísmos aparentes, porém anota a persistência da técnica e a continuidade do gosto e aptidão para mover grandes lajes de granito. Em suma, a continuidade de uma civilização que remonta ao fim do Neolítico, quando o pastoreio e a agricultura fixaram populações no solo.
LOPES MARCELO, Manuel Martins. Moinhos da Baságueda – Comunidades rurais: saberes e afectos. 2ed. Coimbra: Alma Azul, 2003.
Eixos de análise abordados:
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Manuel Martins Lopes Marcelo (1949), português, licenciou-se em economia pelo Instituto Superior de Economia, de Castelo Branco. Ainda estudante, iniciou em 1970, a atividade de docente no 2º Ciclo quando participou também da Associação Académica e do Centro de Ação Social Universitário, promovendo atividades culturais em bairros desfavorecidos de Lisboa. Em 1983, tornou-se docente na Universidade da Beira Interior até 1985, ano em que iniciou a atividade como Professor convidado nas Escolas Superior Agrária e de Gestão e Educação, que manteve até recentemente. Em 1993, culminando vários anos de estudo e pesquisa na região, publicou o livro Beira Baixa: a memória e o olhar, em que propõe uma revisitação da matriz histórica e cultural de Portugal. A partir de 1994, orientou um projeto cultural visando o estudo e a divulgação da cultura e tecnologia tradicional da moagem, tendo como território de referência, os moinhos da Baságueda, e publicando, em 1999, o livro em exame nesta ficha. Além desta obra, o autor publicou vários outros estudos sobre a cultura rural da região da Beira Baixa.
Tecnologia do Sistema de Moagem: caracterização dos subsistemas
O Engenho e a Arte da Construção do Rodízio
Território de Afectos
Histórias da Sabedoria e Vivência Populares
Actividades Produtivas
Usos, Costumes e Tradições
Da Aldeia ao Moinho
Do Apelo das Raízes aos Desafios da Modernidade
Linguagem Popular Corrente de Uso Local
Glossário de Termos e Expressões Populares Referênciados ao Longo do Texto
Bibliografia
Resumo :
O livro aborda os Moinhos da Ribeira da Baságueda, hoje situados na Reserva Natural de Serra da Malcata, em Portugal, e, conjuntamente, a Vila de Penamacor e a freguesia de Aranhas, ambas do Concelho de Penamacor no distrito de Castelo Branco, de onde provêm os moleiros. Apesar de rica em fotos e desenhos, muito hábeis e precisos, falta uma estrutura sistemática à obra, tanto na apresentação, quanto no foco. Em parte, é um registro etnográfico abrangente que mescla-se com um trabalho etnográfico mais específico, centrado nos Moinhos, os quais ganham uma atenção que nenhum outro tópico possui. E, ainda, surge como um livro de memórias que faz a apologia da vida campestre nessa região. A obra tem início com a enumeração do patrimônio cultural de Penamacor e Aranhas: seus edifícios, indumentária característica e ritos mais importantes. Depois descreve o clima, fauna e flora da região. Carece, contudo, da visão holística que possuem os trabalhos clássicos de Geografia e Antropologia portugueses sobre o assunto. Ao falar da Ribeira da Baságueda e de seus moinhos, o autor apresenta uma visão extremamente acurada desses engenhos de água e de seus subsistemas, bem como dos artesãos responsáveis por sua fabricação e manutenção. Esta parte do livro é ilustrada com desenhos primorosos e farta em fotografias. Segue-se, de modo irregular, a apresentação dos ciclos da vida rural, das crianças e jovens e sua relação com a faina e o mundo natural (os coelhos, as perdizes, as trovoadas, etc.), além de seus brinquedos e folguedos. O autor descreve a atividade agrícola: o plantio, colheita, moagem do grão e preparo do pão; as uvas e o preparo do vinho e aguardentes; o linho; o cultivo da azeitona e o preparo do azeite. Descreve também a atividade pecuária, os cuidados e aspectos alimentares decorrentes da criação suína, assim como a produção e usos do mel. Ademais, trata das caçadas e pescarias e de atividades produtivas como a fabricação de telhas, embora de modo superficial. Aborda, por fim, matizes da religiosidade popular, tais como rezas e curas; a farmacopéia da região; lendas, provérbios e expressões; o cancioneiro e os festejos. Conclui com um histórico de sua própria família nesta região.
MOURA, Armando Reis. Espigueiros de Portugal. Parque Natural da Ria Formosa/Instituto da Conservação da Natureza, 1993.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Armando Reis Moura (1931-), português, formado em Ciências Pedagógicas, Ciências Geológicas e Ciências Biológicas, é geólogo e biólogo, além de investigador do patrimônio marítimo. Foi diretor do Departamento de Ciências Biológicas do Instituto de Investigação Científica de Moçambique, e foi professor da Universidade de Aveiro, no Departamento de Biologia. Possui várias obras publicadas sobre fósseis e animais marinhos, e algumas sobre arqueologia naval, embarcações tradicionais e espigueiros.
Informações obtidas na própria obra.
Sumário obra:
Espigueiros
I. Apresentação
II. Prefácio
III. Diretoria
IV. Introdução
V. Panorama bibliográfico
VI. O milho
VII. Definições
VIII. Origens
IX. Evolução dos Espigueiros
X. Estrutura dos Espigueiros
XI. Tipologia dos Espigueiros
XII. Distribuição geográfica dos Espigueiros
XIII. Que futuro?
XIV. Glossário dos Espigueiros
XV. Iconografia
XVI. Bibliografia
XVII. Índice Geográfico do Noroeste de Portugal
XVIII. Índice Iconográfico
XIX. Índice Geral
O Autor
Dados Biográficos
Lista dos Trabalhos
Lista dos Trabalhos
Resumo :
Livro farto em fotos, com glossário minucioso, farta bibliografia e mapa com distribuição dos tipos gerais. Realiza também um panorama bibliográfico, com destaque para autores como Ernesto Veiga de Oliveira e Fernando Galhano. Como tipo geral, o espigueiro é uma construção para armazenamento de grãos que se distribui do Mar Negro à Península Ibérica, em cujo noroeste existe em maior quantidade e diversidade. Sua distribuição apresenta estreita coincidência com a linha de 1000 mm de precipitação anual, que vai de Portugal às Astúrias. Em Portugal, encontram-se nas terras altas do Minho e Douro Litoral, na parte ocidental de Trás-os-Montes e nas Beiras setentrionais e ocidentais. O espigueiro está vinculado à cultura dos cereais – em particular, a do milho – e ao complexo rural, junto com a eira e a sequeira ou alpendre. O ponto de parte é a chegada do milho grosso ou “maiz” em Portugal, entre 1515 e 1525, já presente nos campos do Mondego e, em 1531, em Lamego, no que Orlando Ribeiro chama de “revolução do milho”. O milho maiz substituiu o milho miúdo no Minho, Douro e Beiras, dada a sua maior produtividade e ao uso de sua palha como forragem. Tal mudança implicou em mudanças na quantidade, forma e tipo dos espigueiros. Em Portugal, as propriedades se constituíam de pequenas parcelas, com uso intensivo e regadio, com uma população numerosa e dispersa em aldeias autossuficientes. As casas possuíam anexos ligados à produção de grãos - eira, alpendre, ou sequeiro, e o espigueiro – com a função de secar e guardar o grão como alimento para entressafra e como sementes para o próximo cultivo. Nesse armazenamento, se fazia necessário o combate contra a umidade, problema recorrente na região das culturas de regadio, e contra insetos, aves granívoras e roedores. A sequeira corresponde a uma grande construção de estrutura dispendiosa, junto às eiras, com portadas grandes para abrir em dias de sol, viradas para o Sul, e parte posterior ripada, para circulação de ar. Já o espigueiro, geralmente em forma de paralelepípedo, é uma construção elevada, com pés com mós, ou mesas, para impedir a ascensão de roedores, faces laterais com ripado estreito para impedir a entrada de aves granívoras e garantir ventilação, telhado de duas ou quatro águas e porta instalada no topo. Moura especula sobre suas possíveis origens, sugerindo que vieram de antigos canastros, de “cestaria dura”, feitos de varas de castanheiro, salgueiro e outras plantas, provavelmente já elevados antes da vinda dos Romanos. A primeira representação gráfica de um espigueiro aparece no séc. XIII e a primeira descrição, em castelhano, no final do séc. XVII. Esboça, ainda, uma evolução dos espigueiros galaico-portugueses. Os primeiros seriam grandes cestos, de forma circular, com paredes inclinadas para fora, de cestaria ou cestaria dura, usados desde o neolítico e chegando até nossos dias. Menciona ainda os “cabaços”, de formato oblongo ou retangular, recentemente desaparecidos. A romanização, no séc. II a.C, trouxe cereais mais produtivos de outros recantos do Império e levou ao uso da madeira e a adoção da forma retangular, com exemplares que também sobreviveram. A “petrificação”, ou substituição da madeira pelo granito, é etapa incerta e, atualmente, registram-se espigueiros em tijolo e concreto armado. Em seguida, Moura descreve, em linhas gerais, a estrutura dos espigueiros que é constituída de “assento” e “corpo”. O assento possui: alicerces, ou “socos”, com fundações enterradas ou não; “pés”, para expor ao vento e afastar os grãos da umidade e dos animais, dispostos em pontaletes e pares ou como muros transversais; e “mesas” ou “mós”, respectivamente peças retangulares ou circulares, para bloquear a ascensão de animais. O corpo é composto por: “base”, formada por duas peças de pedra ou madeira, únicas ou ementadas, e “grade” ou “soalho”, também de pedra ou madeira; “esqueleto”, estrutura composta por colunas, prumos, lintéis, padieiras da porta e frechais; “paredes”, que são de pedra, de madeira, em ripados diversos (horizontal, vertical ou oblíquo), ou outros materiais modernos; “portas” e “postigos”; “escoras”; e “telhado”, com duas ou quatro águas, de palha de centeio, telha de todos os tipos ou de pedra que, por sua vez, pode ser lousa, micaxisto, piçarra ou granito. O autor estabelece ainda uma tipologia, dividindo os espigueiros em estreitos, largos, altos, de tijolo e cimento e incorporados. Os espigueiros estreitos, unidirecionais, são divididos naqueles de parede vertical e de parede inclinada, e subdivididos naqueles em pedra, em pedra e madeira ou somente de madeira, com ripado vertical e com ripado horizontal (podendo ter ou não cárpea e guarda-vento). Os espigueiros largos, por sua vez, possuem planta quadrada e, embora com cobertura única, têm dois compartimentos retangulares e corredor central. São também divididos nos de paredes verticais (de pedra e madeira ou exclusivamente de madeira) e nos de paredes inclinadas. Os espigueiros altos, já desaparecidos, se desenvolvem em altura, sobre uma base precária. Cada um desses tipos se desenvolve em outros tipos nomeados a partir de localidades, a exemplo dos de Gondomar, Um aspecto fundamental é que a presença ou ausência de certos materiais não são condicionantes para as escolhas construtivas ou para a adoção dos tipos.
OLIVEIRA, Ernesto Veiga de; GALHANO, Fernando; PEREIRA, Benjamim. Construções Primitivas em Portugal. 2ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1988.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Ernesto Veiga de Oliveira (1910-1990), etnólogo português, foi um dos fundadores do Centro de Estudos de Etnologia e um dos responsáveis pela renovação da Etnografia em Portugal, com extensa produção sobre arquitetura popular. Fernando Galhano (1904-1995) foi um dos fundadores do Museu de Etnologia de Lisboa, versátil desenhista e também autor, sozinho e em parceria, de trabalhos sobre arquitetura popular, sistemas de transporte, tecnologia têxtil, sistemas de moagem e pesca, entre outros. Benjamim Pereira (1928), integrante do Centro de Estudos de Etnologia, foi também dos fundadores do Museu de Etnologia, com trabalhos na mesma área que os demais autores da obra. A primeira edição da obra em exame é de 1969, pelo Centro de Estudos de Etnologia do Instituto de Alta Cultura de Portugal.
Sumário obra:
I PARTE – Construções Primitivas e Elementares
Cap. 1 – Abrigos
I – Abrigos Naturais
II – Abrigos Artificiais
Cap. 2 – Construções de Planta Circular
A – Construções de Planta Circular com Cobertura Cônica de Materiais Vegetais
B – Construções de Planta Circular (ou Quadrada) Inteiramente em Pedra
(Falsa Cúpula)
Cap. 3 – Construções de Planta Quadrangular
A – Construções de Planta Quadrangular Inteiramente em Materiais Vegetais
B – Construções de Planta Quadrangular com Paredes de Pedra e Cobertura
em Materiais Vegetais
Cap. 4 – Barcos de Avieiros
II PARTE – Sistemas Primitivos de Construção
Cap. 5 – Coberturas. Elementos Acessórios da Construção. Diversos.
1) Coberturas
2) Elementos Acessórios da Construção
3) Diversos
Resumé
Índice Geográfico
Índice Analítico
Índice de Desenhos Índice de Figuras
Errata
Resumo :
Obra com abundância de fotos e desenhos, como plantas, cortes e detalhes. O enfoque técnico-construtivo dita a tônica da tipologia e da classificação dos exemplares. A abordagem enfatiza aspectos funcionais, das atividades humanas e condições geoclimáticas, descurando dos aspectos simbólicos. Trata do estudo das formas mais simples e elementares de construção, relacionadas a atividades de caráter arcaico, como abrigos móveis de pastoreio e casas de pescadores, condenadas a desaparecer com o advento dos materiais industriais e a facilidade nos transportes. Os autores dedicam-se primeiro aos abrigos mais elementares. Os “naturais” – como cavernas, grutas e lapas – e os “semi-naturais”, que são melhorias dos anteriores e remanescentes da cultura neolítica nas zonas calcárias do Centro e Sul de Portugal, com casos no Norte, de menores dimensões, onde o granito se decompõe. A maior diversidade aparece nos abrigos “artificiais”. Nos de pedra, registra-se aqueles em “muros e socalcos”, os “simples” e os “malhões”, de pedras secas encasteladas e sem cobertura, no Alentejo, Sintra e Serra da Estrela. Nos abrigos inteiramente de materiais vegetais, distingue-se os “fixos” dos “móveis”. Nos fixos, destacam-se as cabanas, com elemento único formando cobertura e parede, cônicas e de planta quadrangular; as barracas para cultivo do melão nos campos do Tejo e no Alentejo, feitas de tábuas, canas, palhas e ramagens; os abrigos feitos de canas, nas vinhas entre Torres Vedra e o mar, e os de pranchas de cortiça, nas regiões de sobreiros. Nos móveis, descreve-se as “esteiras” e “choços” de pastores no Leste – guarda-ventos e abrigos feitos de palha com elaborada armação de varas -; os abrigos sobre carros (mais raros, ligados ainda ao pastoreio, e distribuídos por todo o país) e casos especiais, como as cabanas de palha de milho no litoral do Porto a Leiria. Depois, o livro trata de construções mais elaboradas, classificadas de acordo com aspectos construtivos e formais. Aborda-se, inicialmente, as de planta circular com cobertura cônica em materiais vegetais, dividindo-as em “inteiriças”, nas que distinguem parede e cobertura do mesmo material e nas de parede de pedra e cobertura vegetal. Nestas surge uma diversidade maior de vestígios, levando a hipóteses sobre a altura das paredes, sobre o material da cobertura - telhas romanas, palha, giesta ou “faxina” recoberta de barro – e sobre sua origem como uma passagem para a pedra de antigas cabanas inteiramente vegetais. As cabanas circulares com cobertura cônica em materiais vegetais apresentam raros exemplares íntegros em regiões arcaizantes ou segregadas. Aquelas com cobertura e parede únicas aparecem na Beira Alta e Alentejo. As do tipo cilíndrico-cônico, com cobertura e parede distintas, surgem apenas como anexos rurais nos currais para gado miúdo (“curveiros”), no Alentejo e nos espigueiros (canastros de varas) no Minho. Das construções de planta circular com paredes cilíndricas de pedra e cobertura cônica de materiais vegetais, há exemplares no Algarve, Alentejo e Beira Alta, como o caso excepcional das barracas de planta arredondada para guarda de barcos e aprestos da apanha de sargaço em Fão e Pedrinhas. Um caso à parte são as construções de planta circular ou quadrada em pedra com fechamento em falsa cúpula, constituída por fiadas horizontais de pedra em diâmetros sucessivamente menores e fechadas por lajes chatas. Em Portugal, são de xisto – no sul, Algarve, Alentejo e Beira Baixa – ou de granito, no norte. Construções sempre de pequenas dimensões, são abrigos temporários, palheiros, pocilgas, queijeiras, moinhos e fornos. Com exemplos pré-históricos e recentes, são alvo de estudo por região em seus aspectos sociológicos e em comparação com análogos europeus. Quanto às construções em planta quadrangular, faz-se classificação similar: cobertura e paredes unitários em matéria vegetal; cobertura e paredes distintas do mesmo material; paredes em pedra e cobertura vegetal. Do primeiro caso, os exemplares são pouco freqüentes. Com cobertura e paredes distintos, são notáveis os palheiros no litoral central, com paredes de tabuado e cobertura de palha, estorno ou junco. No litoral algarvio encontram-se cabanas de junco, estorno ou palha, ligadas à atividade pesqueira, com descrição e história minuciosa dos tipos de cada área, relações socioeconômicas e hipóteses sobre a origem. Exemplares do mesmo tipo encontram-se no Alto Alentejo, Ribatejo e Estremadura, como anexos de unidades agrícolas para recolha de carros e alfaias, currais e depósitos.Das construções em planta quadrangular, com parede de pedra e cobertura vegetal, há descrição minuciosa de exemplares no distrito do Viseu, Médio Tâmega e Baixo Douro. Destaca-se as “malhadas” alentejadas e beiroas, grandes currais unitários para cabras e porcos; as “barracas de sargaço”, abrigos de barcos e utensílios, feitos a partir do depósito do sargaço colhido para adubo, do Douro ao Minho; e os “barcos de avieiros”, da pesca sazonal no Tejo, abrigos de toldos, à beira d´água, ou como extensões dos barcos. Depois desse elenco tipológico, o livro aborda os sistemas primitivos de construção. Primeiro, as coberturas, destacando-se o emprego do material vegetal, em franco desaparecimento e substituição pela telha. Descreve-se a estrutura habitual e as formas da cumeeira, da proteção contra o vento e a abertura para fumaça. Das coberturas em pedra, além da falsa cúpula, registra-se o xisto em escamas de pedra, com pouca inclinação e sobre armações de madeira, como nos espigueiros. E o uso do granito, em placas de grandes dimensões – no Alto Minho, em especial - sem subestrutura, em fornos e espigueiros. Menciona-se ainda o uso da terra como cobertura, na ilha de Porto Santo. Em seguida, são estudados os “elementos acessórios”: esteiras vegetais, pedra (para colunas, pilares, lajes verticais e cachorros), tabiques, taipas, adobes e pastas. Os tabiques são paredes de madeira e materiais leves revestidas de argamassa, usadas em divisórias e, em alguns casos, como paredes externas. As taipas são paredes de terra grossa, amassada e calcada em moldes que depois são retirados, empregadas no Sul como paredes e muros. Os adobes são paralelepípedos de barro amassado, misturado com areia ou palha cortada, feitos em moldes de madeira e secos ao sol, mais comuns na zona litoral do centro, a partir do Aveiro, e no Sul. E a “pasta” compõe-se de grandes placas de granito cujas juntas são argamassadas.
PEREIRA, Benjamim. Sistemas de Serração de Madeiras. Lisboa: INIC – Instituição Nacional de Investigação Científica/ Centro de Estudos de Etnologia, 1990.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Benjamim Enes Pereira (1928), antropólogo português, fez parte da equipe fundadora Museu Nacional de Etnologia. Autor de obras indispensáveis ao conhecimento da cultura material tradicional portuguesa, em particular as que resultaram das linhas de investigação do Centro de Estudos de Etnologia e do Museu Nacional de Etnologia, o seu percurso profissional é também marcado pela importância que cedo conferiu ao uso da imagem, fotográfica e em movimento, na documentação das realidades sociais, especialmente com vista ao seu uso em contexto museológico. Dentre suas obras, destaca-se a Bibliografia Analítica da Etnografia Portuguesa, editada em 1965 pelo Instituto de Alta Cultura.
Obra farta em fotos e ilustrações de Fernando Galhano e Manuela Costa que trata das técnicas tradicionais de serração de madeira. Começa-se reconhecendo a proeminência da madeira, como material privilegiado, na História. Entre suas vantagens, assinala-se as grandes dimensões de suas peças, a sua abundância em várias partes do globo, o trabalho (corte, talho, preparo) e o transporte (rolagem e flutuação) fáceis. Assim, era material primordial da era eotécnica, base dos principais instrumentos de caça, da tecnologia agrícola, dos meios de transporte (barcos, trenós e carros), de pontes e fortificações, crucial nos processos mecânicos de transformação – em moinhos e motores, equipamentos têxteis, tornos e prensas – além de seu importante papel no universo ritualístico, na estatuária e em máscaras. Tão versátil que ainda estava presente quando da ascensão da metalurgia, no séc. XIX. Duas seriam as formas de construção em madeira encontradas na Europa. Uma, com estrutura em esqueleto com montantes e traves, onde havia florestas abertas e luminosas de árvores de folhagem na Alemanha, Suíça, França, Inglaterra e sul da Escandinávia. Outra, com paredes autoportantes de toros ou pranchões horizontais, onde havia densas florestas de coníferas como na Rússia, Finlândia, Escandinávia, Europa Central e Alpes. Ao sul da Europa, com árvores mais escassas, apareceria outro tipo de construção. Portugal apresenta três áreas florestais, com predomínio de distintos tipos de árvore. O pinheiro bravo domina no oeste atlântico, em área delimitada ao norte pelo rio Minho e, ao sul, pela embocadura do Sado, avançando para o interior pela vertente ocidental da cadeia montanhosa do centro do país. Árvores de folha caduca, carvalhos e castanheiros, predominam nas terras altas, Serra Minhota, Trás-os-Montes, Beiras Interiores, até as serras de São Mamede, Sintra e Monchique. No Sul, no Alentejo e no sudeste da Beira Baixa, seria a área do Quercus, de folha perene, montados de sobreiro e azinheiro. Tais zonas florestais teriam correspondência arquitetônica. No sul, apelou-se ao emprego de abóbadas e chãos ladrilhados, enquanto nas regiões ricas em madeira, nortenhas, despontou uma arquitetura em madeira, com uso amplo em pavimentos, armação de telhados, portas e janelas. Após uma rápida história das serras a partir da Idade da Pedra, mostrando-se modelos históricos e interpretando-se a iconografia existente, aborda-se a situação em Portugal. As Grandes Navegações foram a grande demanda que definiram a serração no país, inclusive com políticas reais para fornecimento e trato da madeira. Para abastecimento dos estaleiros, recorreu-se, principalmente, aos Pinhais de Leiria, grande mata nacional cuja serração atraiu e fixou gente, propiciando mesmo sua especialização nessa tarefa. O transporte da madeira se dava em geral pelos rios, mas também em, alguma medida, por meio de carros de bois. Em seguida, e este é o cerne da obra, descreve-se as três formas de serração tradicional: braçal, hidráulica e eólica. A serração braçal era preponderante até a aparição das serras em fita de efeito contínuo, dada a fragilidade dos sistemas mecânicos tradicionais e as limitações da rede viária. Executava-se por pares de indivíduos – unidade laboral chamada “serra” – que se embrenhava nas florestas, em trabalho itinerante e imprevisível, vivendo temporariamente em abrigos elementares, de costaneiras e ramos de árvores. O trabalho se desempenhava no local da derrubada, com corte em toras, descascamento e alinhamento, necessitando de sincronia, força e experiência, onde o papel de comando era, também, o de maior esforço. Os engenhos de serração hidráulica, por sua vez, aparecem em documentos do início do séc. XV, com rápida difusão, propagando-se para as ilhas atlânticas, em especial o arquipélago da Madeira, que tinham abundância de madeiras boas e de veios d´água aproveitáveis. Estão especialmente localizados entre os rios Douro e Minho, no Noroeste do país – dotado de excepcional rede hidrográfica e intensas manchas de arvoredo junto de rios ou ribeiros. Com frequência, ficavam ao lado da casa do proprietário, em geral, numa construção em pedra, de planta triangular, com rodas alimentadas por desvios dos rios ou por meio de açudes. Estas construções são pequenas, ao alcance de qualquer um, com maquinário elementar e de fácil construção. O modelo de organização do empreendimento é simples, onde um só indivíduo podia mantê-lo operando. Com produção de baixo nível econômico, não há sucesso da técnica em quadro de exploração capitalista. Ao contrário, é empregada em exploração do tipo familiar, com pluriemprego, sempre subsidiária de outras operações, como instalações de moagem, e com emprego de pouco capital. Seu manuseio é realizado pelo proprietário ou criado e, em alguns casos, por diaristas. Quanto aos engenhos de serração eólica, há menção a um exemplar apenas, montado por técnicos holandeses no tempo de D. João V, sem muita informação a respeito do exemplar, embora com registros que dão conta de uma estrutura técnica e administrativa complexa. A coexistência de tais sistemas nem sempre foi pacífica. Ao contrário, as medidas legais se davam sempre em detrimento da serração braçal, com proteção às serrações mecânicas. Apesar da chegada tardia em Portugal, a serração mecânica industrial foi responsável pela extinção dos sistemas tradicionais.
DIAS, Jorge e GALHANO, Fernando. Aparelhos de Elevar a Água de Rega – contribuição para o estudo do regadio em Portugal. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1986.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Fernando Galhano (1904-1995) foi etnógrafo, desenhista e pintor português, além de um dos fundadores do Museu de Etnologia de Lisboa. Em colaboração com Jorge Dias, Ernesto Veiga de Oliveira, Benjamim Pereira e outros, participou em diversos trabalhos sobre arquitetura popular, alfaia agrícola, sistemas de transporte, cestaria, olaria, tecnologia têxtil, sistemas de moagem e pesca.
António Jorge Dias (1907-1973), etnólogo português, realizou seu doutorado na Universidade de Munique. Foi professor catedrático do Instituto Superior de Ciências Sociais de Lisboa, e diretor da secção de etnografia do Centro de Estudos de Etnologia Peninsular. Notabilizou-se por trabalhos na área de Antropologia Cultural que partem da integração da vida material e espiritual, enquadrada no seu meio natural e cultural.
A obra em exame foi publicada pela primeira vez em 1953, pela Junta de Província do Douro-Litoral, cidade do Porto.
Portugal, como o restante do sul da Europa, embora na faixa seca do planeta e sob a influência desértica do Saara, tem tal aridez mitigada pela grande superfície de evaporação do Mediterrâneo. Ainda que Portugal situe-se na área úmida da Península Ibérica, pela ação dos ventos atlânticos, possui verões com condições climáticas mediterrâneas. Nesse país, até 10% do território é irrigado, sem grandes obras, a partir da iniciativa particular, com pequenas nascentes ou poços e, nelas, alguns sistemas de distribuição de águas comuns por meio de velhas organizações comunitárias. A presença maior é na área mais chuvosa do país, o Noroeste, onde há condições para ação individual. São, portanto, as técnicas de irrigação ou “rega” de Portugal que este livro pretende estudar, com fartura de fotos e desenhos ilustrativos dos maquinismos, além de mapas que indicam os casos e sua distribuição. Distingue-se, inicialmente, os perfis gerais das formas de rega. Há as “águas de lima”, onde se mantém uma película permanente de água para irrigar e evitar os danos das geadas. Há a “rega pelo pé”, com valas abertas a enxada, no momento da irrigação, com água vinda de ribeiros ou represas. E, por fim, a “rega à manta”, com a água alastrando-se naturalmente pelo terreno. A rega se divide ainda naquelas de “abundância”, onde se reforçam os agentes naturais metereológicos, como no cultivo europeu dos fenos, e as de “carência”, que visam captar e reter as águas para regar hortas, pomares e campos no verão e são comuns na bacia do Mediterrâneo e no Oriente. O regadio sem aparelhos é a forma mais antiga, aproveitando nascentes naturais. Com água pouco abundante, usam-se pequenas represas, de pedra ou mesmo terra, abertas uma vez alcançado o volume. Nas ilhas de Madeira aparece um sistema de rega de magnitude excepcional, com canais de pedra, as levadas, e, nestas, aquelas de uso comunitário – as levadas do povo – controladas pelo juiz de levada. Este é análogo a outras figuras semelhantes em Portugal que derivam de formas de gestão coletiva originárias do idiossincrático direito consuetudinário sobre o uso das águas de cada comunidade. As barragens do Alentejo usam os mesmos princípios da rega nortista, com maior arrojo nas construções, já que, se no norte havia nascentes naturais ou de mina pelos solos graníticos, no sul não ocorre isso e as chuvas são mais escassas, captadas no inverno para abastecer no verão. Na captura das águas com uso de aparelhos, há a diferença de sua força motriz por meio de agentes naturais, animais e homens. Nos aparelhos movidos por agentes naturais, lança-se mão do vento e da própria água. O aproveitamento do vento se dá por moinhos, com maior concentração no sul de Portugal – com uso de barrotes para captar o vento, com ou sem velas, com ou sem pás de madeira. Menos eficiente do que as noras, são porém mais baratos. O aproveitamento da água se dá, em sua maioria, por “rodas hidráulicas”, onde a mesma água que irriga os campos é a que movimenta o aparelho. De maior freqüência ao norte, em alguns casos, se canaliza a água que alimenta a roda por “calhões” e “sobrecalhões”. As rodas hidráulicas são descritas exaustivamente, por tipos de rodas e seus alcatruzes. Outros aparelhos que usam a água como força motriz são os “engenhos de copos” e os “estanca-rios”. Entre os aparelhos movidos por animais, os autores identificam quatro tipos: “noras de alcatruzes, noras de sarilhos, rodas de alcatruzes e engenhos de bucha”. Identificam, ainda, sucessivos tipos e subtipos, considerando o material, o tipo de eixo e outros pormenores. Observam ainda sobre as adaptações, a construção e o reparo dos engenhos, as formas modernas de ferro fundido e os abrigos feitos para proteger os maquinismos, em geral telheiros. Os aparelhos movidos pelo homem são mais diversos, empregados em pequenas áreas – hortas e pequenos campos – ou em lugares carentes de agentes naturais e animais. Os tipos são muito variados: “noras de copos manuais, engenhos de buchas manuais, roldanas, sarilhos, picotas ou cegonhas, bombas de rebiço, bombas de tear, rodas de tirar água, rodas de ferro, pontarias de pé, cegonhos, e ainda cabaços, garabatos e cestos de vime”. A obra não se propõe a ser um inventário sistemático de tais técnicas em Portugal, mas há a preocupação, recorrente nesse tipo de estudo antropológico, de assinalar a distribuição das técnicas ao longo do país e, por meio de pesquisa bibliográfica, inferir a origem de cada modalidade técnica, com maior ou menor êxito em cada caso.