REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. 4.ed. São Paulo: Perspectiva, 1978. 214 p
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Nestor Goulart Reis Filho possui graduação em Arquitetura e Urbanismo (1955) e em Ciências Sociais (1962) pela Universidade de São Paulo. Atualmente é professor catedrático (titular) da Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em História e Teoria da Urbanização, do Urbanismo e da Arquitetura, atuando principalmente nos seguintes temas: patrimônio, urbanização colonial e urbanização contemporânea, em especial no que se refere ao Brasil. A obra em causa foi publicada pela primeira vez em 1970.
As condições da arquitetura na segunda metade do século
A evolução das técnicas construtivas
As residências
Crítica do ecletismo
Sobre o patrimônio de cultura
Bibliografia
Bibliografia do autor
Índice das ilustrações
Resumo :
Formado a partir da compilação de ensaios sobre arquitetura que Reis Filho publicou no “Suplemento Literário” de O Estado de São Paulo durante a década de 1960, o livro busca “delinear um quadro de referências básicas para o estudo da Arquitetura no Brasil”. O autor procura superar os limites das análises de problemas exclusivamente formais, com a intenção de relacionar a arquitetura com um quadro mais amplo, sobretudo com as estruturas urbanas e com a condição social e cultural do Brasil. Assim, Reis Filho afirma ser uma necessidade deixar de encarar a arquitetura brasileira como simples transposição da europeia, para reconhecer a evolução de suas condições concretas de produção e uso no país. A obra é dividida em três áreas principais. Na primeira, “Lote urbano e arquitetura no Brasil”, é destacada a interdependência entre os modelos de arquitetura produzidos e as estruturas das cidades em que estão inseridos (os lotes urbanos). Trata-se de um quadro urbano que indica simultaneamente as diretrizes seguidas pela evolução, no tempo, desse conjunto de relações e as formas atingidas no momento em que o autor escreve, além de suas perspectivas de desenvolvimento. Ao discutir o lote urbano colonial, o autor destaca a produção e o uso da arquitetura naquele período: reprodução da tradição popular portuguesa com uniformidade de partidos arquitetônicos, mas baseada no trabalho escravo e empregando níveis tecnológicos dos mais precários. Reis Filho observa que a produção da arquitetura no século XIX é decorrência da continuação da dependência do trabalho escravo e do uso de técnicas construtivas ainda primitivas, porém, com a vinda da Missão Cultural Francesa à Corte, também se registra o aparecimento de construções mais refinadas. Na segunda metade do século, o trabalho escravo entra em decadência e inicia-se a imigração europeia, desenvolvendo-se o trabalho remunerado, o aperfeiçoamento das técnicas de construção e novos esquemas de implantação das casas urbanas. A partir de então, começam a surgir profissionais de arquitetura e engenharia mais qualificados, influindo de modo mais determinante no desenvolvimento das cidades. A maior parte das experiências arquitetônicas e urbanísticas desde então passa a ser realizada por estes profissionais, culminando com a construção de Brasília. No segundo momento, a obra discute as primeiras conclusões de uma pesquisa sobre a arquitetura brasileira no século XIX, que ainda se encontrava em andamento, a época da publicação da sua primeira edição. O autor justifica que o tema é especialmente interessante porque “permite focalizar as dificuldades do emprego de uma interpretação puramente formal para a explicação das transformações ocorridas durante aquele período da história brasileira”. Aqui é tratado de modo mais detalhado a absorção do Neoclássico em terras brasileiras, ocorrida a partir do processo de independência política, em substituição aos padrões barrocos que haviam prevalecido durante o período colonial. Esta nova linguagem, segundo o autor, firmou-se em duas versões: o neoclássico oficial da Corte, quase todo feito de importações, e a versão provinciana, simplificada, feita por escravos, com edifícios copiados de exemplares construídos nos centros urbanos de maior importância, utilizando-se muitas vezes de técnicas construtivas precárias. Já na segunda metade do século, com a instalação das estradas de ferro e o desenvolvimento das áreas urbanas, ocorreu uma crescente influência do Ecletismo, que se tornou predominante após a proclamação da República. O autor considera que o século XIX é o momento da história do país no qual arquitetos e engenheiros procuraram alcançar um certo nível de independência cultural e tecnológica, enquanto as condições socioeconômicas continuavam a ser basicamente as mesmas do período colonial. A última parte do livro aborda o patrimônio cultural, procurando “pôr em evidência a importância da utilização mais intensa de nosso patrimônio de arte e história, para a realização de programas culturais criativos nas regiões mais densamente urbanizadas do país”. Discute a integração social das populações dessas áreas com o patrimônio e suas relações com o turismo e com a cultura. O assunto é analisado a partir da realidade cultural vivenciada na região metropolitana de São Paulo, à época da primeira edição do livro, mas Reis Filho acredita que tal abordagem poderia servir como introdução ao estudo de problemas que já ocorriam em diversas regiões do país, em decorrência da industrialização acelerada.
Biblioteca da Universidade Federal do Espírito Santo
Referência bibliográfica:
MATEUS, João Mascarenhas. “Nomadismos das culturas da terra, da pedra e da madeira. Um tema fundacional da história da construção luso-brasileira” In: RIBEIRO, Nelson Pôrto (org). Subsídios para uma história da construção luso-brasileira. Rio de Janeiro: Pod Editora, 2013, p. 29-43.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Dados sobre o autor(es) e obra:
João Mascarenhas Mateus é ínvestigador do Centro de Estudos Sociais, Núcleo de Cidades, Culturas e Arquitectura da Universidade de Coimbra, Portugal. Licenciado em Engenharia Civil, fez o Mestrado em Ciências da Arquitetura na Katholieke Universiteit Leuven, Bélgica, onde trabalhou como assistente de investigação (1993-1995). Realizou na Universidade La Sapienza de Roma, Itália a investigação de doutoramento sobre a utilização de técnicas tradicionais de construção de edifícios de alvenaria na atividade da conservação arquitetônica. Foi "Cultore della materia" na Faculdade de Arquitetura Valle Giulia da Univ. La Sapienza de Roma (2002-2004) e é colaborador científico da “Scuola di Specializzazione in Conservazione dei Monumenti” da mesma Universidade, desde 2002. Organizou em 2010 a Primeira Conferência sobre História da Construção em Portugal e foi um dos coordenadores do I Congresso da História da Construção Luso-Brasileira (2013).
O autor realiza interessante revisão bibliográfica dos estudos portugueses e brasileiros sobre arquitetura popular e sistemas construtivos a partir da segunda metade do século XIX, avaliando, nos dois países, como foram apropriados para articular construção tradicional e identidade nacional, como influenciaram a produção arquitetônica em determinados períodos e geraram linhas para identificação de “uma genealogia” dos principais sistemas construtivos utilizados. Sobre Portugal, informa-se que os primeiros estudos etnográficos (1870-1890) foram integrados a investigações sobre tradições populares e voltados para a definição de uma identidade portuguesa – linha que caracterizou por muito tempo os estudos sobre habitação e arquitetura popular. Gradualmente, contudo, abandonou-se a ideia de uma “casa portuguesa”, reconhecendo-se a diversidade etnográfica do país e a adaptação das construções ao clima e às características da paisagem. Inicia-se então uma abordagem mais “relativista”, vinculada ao conceito de “nomadismo artístico”, conforme proposto por João Barreira em 1928, que buscava explicar as influências africanas e asiáticas na arte e na construção manuelina. Apesar desses avanços, até os anos 1950, predominaram estudos tipológicos que buscavam demonstrar o caráter nacional da arquitetura portuguesa. Paralelamente, levantamentos sistemáticos dos principais sistemas construtivos foram realizados, obtendo-se uma visão completa das culturas construtivas do país. A partir de 1920, esses estudos foram utilizados politicamente para a afirmação da arquitetura portuguesa como símbolo da nação, fundamentando programas governamentais de produção habitacional. O movimento “Casa Portuguesa”, que buscou articular essas características à nova construção em concreto armado, inicia-se nesse momento, contemporâneo do movimento Neocolonial brasileiro. Este último, ao afirmar uma identidade construtiva brasileira integradora de influências portuguesas, africanas e indígenas, teria deflagrado, no Brasil, estudos sobre como o ensaio Construções de Taipa (1946) de Carlos Borges Schmidt e outros como Arquitetura Brasileira – Sistemas Construtivos (1950-51) de Sylvio de Vasconcellos. O autor localiza nesses movimentos o início do diálogo que buscou identificar traços arquitetônicos comuns aos dois países e de onde brotará, mais tarde, uma fase madura de investigação. O artigo desenvolve ainda uma genealogia dos estudos brasileiros sobre o tema, identificando-se o seu início em 1839 nas investigações do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro sobre os povos ameríndios, e o seu desenvolvimento no século XX com os artigos de Gilberto Freyre e Wasth Rodrigues publicados na Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, bem como com os trabalhos de Robert Smith e Sylvio de Vasconcelos. Uma abordagem “madura” teria surgido em Portugal nos anos 1960, ressaltando-se A Arquitectura Tradicional Portuguesa (1992), de Ernesto Oliveira e Fernando Galhano, como a obra mais relevante, além dos escritos de Orlando Ribeiro. As investigações contemporâneas que focalizam aspectos tecnoló gicos e socioeconômicos da arquitetura vernácula em Portugal e no Brasil decorreriam desses estudos, mas Mateus aponta a necessidade de retomada das abordagens etnográficas e geográficas, já que o estudo dos grandes saltos tecnológicos não daria conta de caracterizar essa produção. Conclui que as culturas construtivas portuguesa e brasileira não “pertencem” a esses países, sendo resultado de nomadismos e contaminações recíprocas entre influências ibéricas, mediterrâneas, africanas, asiáticas e americanas.
DAVIS, H. The Culture of Building. New York: Oxford University Press, 2006, p.5.
FREYRE, Gilberto. Um estudo do Prof. Aderbal Jurema. Cadernos de Província 14, 1954.
MATEUS, João Mascarenhas. Técnicas Tradicionais de Construção em Alvenaria. Lisboa: Livros Horizonte, 2002.
MESTRE, V. La construcción tradicional en el espacio mediterrâneo portugués. Apuntes 20 p. 278-285.
MORLEY, Jane. Building Themes in Construction History: recente work by the Delaware Valley Group. Construction History Vol. 3: 13-30, 1987.
OLIVEIRA E. e GALHANO, F. Casas esguias do Porto e sobrados do Recife. Arquitetura Tradicional Portuguesa. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
PEIXOTO, R. Etnografia Portuguesa. Habitação. Os Palheiros do Litoral. In: Estudos de Etnografia e Arqueologia. Câmara Municipal de Póvoa do Varzim, I,: 70-88, [1899], 1967.
PEIXOTO, R. A Casa Portugueza. In: Estudos de Etnografia e Arqueologia. Câmara Municipal de Póvoa do Varzim, I,: 153-165, [1899], 1967.
SEVERO, Ricardo. A Arte Tradicional no Brasil: a casa e o templo – 1914. In: Conferências 1914-1915. São Paulo: Sociedade de Cultura Artística: Tipographia Levi, 1916, p. 43-44.
ISBN ou ISSN:
85-213-0173-1
Autor(es):
Marianno Carneiro da Cunha
Onde encontrar:
Acervo Profa. Marcia Sant´Anna
Referência bibliográfica:
CUNHA, Marianno Carneiro da. Da Senzala ao Sobrado: arquitetura brasileira na Nigéria e na República Popular do Benim. São Paulo: Nobel: EDUSP, 1985.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
Marianno Carneiro da Cunha (1926-1980) estudou filosofia na Universidade de São Paulo e realizou seu doutorado sobre o pensamento religioso da Babilônia na École des Hautes Études de Paris. No Museu de Arqueologia e Etnologia da USP desenvolveu seus estudos sobre a África, onde também lecionou na Universidade de Ifé, Nigéria. Este livro, editado pela primeira vez em 1985, é o resultados das pesquisas desenvolvidas por Marianno na Nigéria e na República Popular do Benim, entre 1975 e 76. Esta publicação bilíngue, em português e inglês, conta com uma Introdução de Manuela Carneiro da Cunha que, em vários aspectos, complementa o estudo de Marianno e com um importante ensaio fotográfico de Pierre Verger sobre a influência da arquitetura brasileira nessa região africana.
Informações obtidas na obra fichada.
Sumário obra:
INTRODUÇÃO: por Manuela Carneiro da Cunha
Trajetórias: africanos no Brasil e brasileiros na África
Os libertos em Lagos
Lagos, mosaico de comunidades
Uma territorialidade construída
Casas, um investimento
Arquitetura tradicional iorubá
Notas
DA SENZALA AO SOBRADO. ARQUITETURA BRASILEIRA NA NIGÉRIA E NA REPÚBLICA POPULAR
DO BENIM: por Marianno Carneiro da Cunha
A comunidade brasileira e sua influência
A difusão de uma nova arquitetura
A arquitetura ioruba tradicional: sua evolução interna
A casa colonial brasileira. A casa de planta simétrica
As casas novas e as concepções tradicionais do espaço
Notas
Bibliografia
ENSAIO FOTOGRÁFICO: por Pierre Verger
APÊNDICES
Resumo :
Embora o estudo principal publicado nesta obra seja de Marianno Carneiro da Cunha, na Introdução, Manuela Carneiro da Cunha fornece importantes informações históricas sobre o processo de retorno de ex-escravos brasileiros à África e sobre como constroem na região da Nigéria e do Benim uma nova territorialidade. Nela criam uma nova arquitetura baseada na casa colonial brasileira de corredor central. A autora atribui este retorno às perseguições e leis discriminatórias promulgadas no Brasil contra os escravos a partir de 1830, às deportações freqüentes que ocorrem a partir desta época, bem como ao incremento do comércio entre África e Brasil, o que incentivou o movimento de retorno de libertos a esta região africana. Em Lagos, capital da atual Nigéria, os retornados formam uma primeira burguesia de cultura eminentemente ocidental, cuja referência principal era a Bahia, sediada no chamado “bairro brasileiro”. Neste bairro, que Manuela Carneiro da Cunha define como “a transposição do Brasil em terras d´África" (p.45), realizavam-se celebrações religiosas e folguedos populares, como a burrinha, típicos da Bahia. Os brasileiros encontraram na região de língua iorubá a arquitetura tradicional dos compounds à qual contrapuseram a arquitetura e as técnicas construtivas desenvolvidas no Brasil. Os compounds são conjuntos quadrados ou retangulares que abrigam famílias extensas, formados por unidades construtivas voltadas para um pátio interior que concentra a vida doméstica e social do grupo, tendo apenas, em geral, uma abertura para o exterior. Os compounds são formados de pequenas unidades residenciais mais ou menos retangulares, com aproximadamente 3,00 x 1,5 m, dispostas lado a lado, com uma porta de entrada voltada para a varanda que se desenvolve em torno do pátio central. O conjunto é construído com adobe e cobertura de palha ou de telhas cerâmicas nas construções de maior prestígio, materiais que, paulatinamente, foram sendo substituídos por telhas corrugadas. O estudo de Marianno Carneiro da Cunha demonstra como a arquitetura brasileira foi introduzida neste contexto e, principalmente, como e porque alcançou uma enorme difusão e prestígio, chegando mesmo a alterar o panorama da arquitetura secular autóctone dessa região africana. Marianno atribui esse fato à competência e ao conhecimento dos artesãos e construtores brasileiros que aportaram em Lagos no século XIX, mas, principalmente, ao modo como a organização espacial da arquitetura que trouxeram adequava-se à cultura iorubá e ao seu padrão espacial. Ao realizar esta análise, Marianno filia-se à abordagem de Rapoport sobre o substrato cultural da forma arquitetônica. Afirma que a modificação da arquitetura tradicional iorubá, a partir das construções brasileiras, teria se dado sem grandes rupturas porque não teria havido alteração da essência da sua concepção espacial. Para demonstrar essa tese, Marianno associa a organização espacial em torno de uma centralidade – o pátio - do compound iorubá, obtida progressivamente a partir da junção de unidades provenientes do modelo de casa rural isolada, à centralidade também presente na casa colonial brasileira de corredor central. O autor mostra exemplos dessa apropriação e traça paralelos entre a cultura patriarcal do Brasil colonial e a cultura também patriarcal e hierarquicamente marcada da região iorubá.