CUNHA, Marianno Carneiro da. Da Senzala ao Sobrado: arquitetura brasileira na Nigéria e na República Popular do Benim. São Paulo: Nobel: EDUSP, 1985.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
Marianno Carneiro da Cunha (1926-1980) estudou filosofia na Universidade de São Paulo e realizou seu doutorado sobre o pensamento religioso da Babilônia na École des Hautes Études de Paris. No Museu de Arqueologia e Etnologia da USP desenvolveu seus estudos sobre a África, onde também lecionou na Universidade de Ifé, Nigéria. Este livro, editado pela primeira vez em 1985, é o resultados das pesquisas desenvolvidas por Marianno na Nigéria e na República Popular do Benim, entre 1975 e 76. Esta publicação bilíngue, em português e inglês, conta com uma Introdução de Manuela Carneiro da Cunha que, em vários aspectos, complementa o estudo de Marianno e com um importante ensaio fotográfico de Pierre Verger sobre a influência da arquitetura brasileira nessa região africana.
Informações obtidas na obra fichada.
Sumário obra:
INTRODUÇÃO: por Manuela Carneiro da Cunha
Trajetórias: africanos no Brasil e brasileiros na África
Os libertos em Lagos
Lagos, mosaico de comunidades
Uma territorialidade construída
Casas, um investimento
Arquitetura tradicional iorubá
Notas
DA SENZALA AO SOBRADO. ARQUITETURA BRASILEIRA NA NIGÉRIA E NA REPÚBLICA POPULAR
DO BENIM: por Marianno Carneiro da Cunha
A comunidade brasileira e sua influência
A difusão de uma nova arquitetura
A arquitetura ioruba tradicional: sua evolução interna
A casa colonial brasileira. A casa de planta simétrica
As casas novas e as concepções tradicionais do espaço
Notas
Bibliografia
ENSAIO FOTOGRÁFICO: por Pierre Verger
APÊNDICES
Resumo :
Embora o estudo principal publicado nesta obra seja de Marianno Carneiro da Cunha, na Introdução, Manuela Carneiro da Cunha fornece importantes informações históricas sobre o processo de retorno de ex-escravos brasileiros à África e sobre como constroem na região da Nigéria e do Benim uma nova territorialidade. Nela criam uma nova arquitetura baseada na casa colonial brasileira de corredor central. A autora atribui este retorno às perseguições e leis discriminatórias promulgadas no Brasil contra os escravos a partir de 1830, às deportações freqüentes que ocorrem a partir desta época, bem como ao incremento do comércio entre África e Brasil, o que incentivou o movimento de retorno de libertos a esta região africana. Em Lagos, capital da atual Nigéria, os retornados formam uma primeira burguesia de cultura eminentemente ocidental, cuja referência principal era a Bahia, sediada no chamado “bairro brasileiro”. Neste bairro, que Manuela Carneiro da Cunha define como “a transposição do Brasil em terras d´África" (p.45), realizavam-se celebrações religiosas e folguedos populares, como a burrinha, típicos da Bahia. Os brasileiros encontraram na região de língua iorubá a arquitetura tradicional dos compounds à qual contrapuseram a arquitetura e as técnicas construtivas desenvolvidas no Brasil. Os compounds são conjuntos quadrados ou retangulares que abrigam famílias extensas, formados por unidades construtivas voltadas para um pátio interior que concentra a vida doméstica e social do grupo, tendo apenas, em geral, uma abertura para o exterior. Os compounds são formados de pequenas unidades residenciais mais ou menos retangulares, com aproximadamente 3,00 x 1,5 m, dispostas lado a lado, com uma porta de entrada voltada para a varanda que se desenvolve em torno do pátio central. O conjunto é construído com adobe e cobertura de palha ou de telhas cerâmicas nas construções de maior prestígio, materiais que, paulatinamente, foram sendo substituídos por telhas corrugadas. O estudo de Marianno Carneiro da Cunha demonstra como a arquitetura brasileira foi introduzida neste contexto e, principalmente, como e porque alcançou uma enorme difusão e prestígio, chegando mesmo a alterar o panorama da arquitetura secular autóctone dessa região africana. Marianno atribui esse fato à competência e ao conhecimento dos artesãos e construtores brasileiros que aportaram em Lagos no século XIX, mas, principalmente, ao modo como a organização espacial da arquitetura que trouxeram adequava-se à cultura iorubá e ao seu padrão espacial. Ao realizar esta análise, Marianno filia-se à abordagem de Rapoport sobre o substrato cultural da forma arquitetônica. Afirma que a modificação da arquitetura tradicional iorubá, a partir das construções brasileiras, teria se dado sem grandes rupturas porque não teria havido alteração da essência da sua concepção espacial. Para demonstrar essa tese, Marianno associa a organização espacial em torno de uma centralidade – o pátio - do compound iorubá, obtida progressivamente a partir da junção de unidades provenientes do modelo de casa rural isolada, à centralidade também presente na casa colonial brasileira de corredor central. O autor mostra exemplos dessa apropriação e traça paralelos entre a cultura patriarcal do Brasil colonial e a cultura também patriarcal e hierarquicamente marcada da região iorubá.