HIJIOKA, Akemi ; JOAQUIM, Bianca.; INO, Akemi. Minka - The houses of Japanese imigrants in Ribeira valley, São Paulo, Brazil. In: Mariana Correia; Gilberto Carlos; Sandra Rocha (Orgs.). Vernacular Heritage and Earthen Architecture - Contributions for sustainable development. 1 ed. London: Taylor & Francis, 2013, v. 1, p. 99-104.
Eixos de análise abordados:
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Território e etnicidade
Dados sobre o autor(es) e obra:
Akemi Ino é formada em Engenharia Civil pela USP (1979), com mestrado em Arquitetura e Urbanismo pela USP (1984), especialização na Osaka City University, Japão (1987) e doutorado em Engenharia Civil pela Escola Politécnica da USP (1992). É professora Livre Docente no Instituto de Arquitetura e Urbanismo – USP, coordenando o Grupo HABIS (Habitação e Sustentabilidade), criado em 1993.
Akemi Hijioka é formada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Braz Cubas (1992), com mestrado em Urbanismo pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (2007) e Doutorado em andamento na Universidade de São Paulo/São Carlos sobre as moradias dos imigrantes japoneses no Vale do Ribeira. É ainda pesquisadora do Grupo Habis (Grupo de Pesquisa em Habitação e Sustentabilidade) pela USP/São Carlos e atua, entre outras coisas, na restauração do patrimônio histórico com ênfase na arquitetura de origem japonesa.
O artigo apresenta as moradias dos imigrantes japoneses no Vale do Ribeira, sul do estado de São Paulo, em frente de ocupação iniciada em 1913 e baseada em agricultura familiar numa área inóspita. As habitações repetiam as características da minka, a casa popular japonesa, com emprego do tsuchikabe – técnica desenvolvida gradualmente no Japão a partir do séc. VII. Trata-se de sistema construtivo que utiliza terra misturada à palha aplicada sobre entramado de madeira que possui função estrutural, além de vedação, já que seus sarrafos verticais e horizontais travam o vão. Sobre estes são postos bambus roliços. Depois, uma trama de bambus partidos e, por fim, a terra, preparada com antecedência, com mescla de palha e água. A minka constitui-se de uma planta retangular com divisórias, construída em dois níveis. A parte térrea, a doma, é pavimentada com terra misturada à cal, água de cinzas e outros elementos para dar maior consistência, recebendo as atividades que utilizam água e fogo, como preparo de alimentos e atividades produtivas. A parte elevada, a cerca de 40 cm acima do solo, é de madeira e a ela se deve aceder sem os calçados. A minka se divide em tipos conforme a atividade do proprietário (se pescador, agricultor, etc.). As casas do vale do Ribeira são quase todas em terra e madeira. Num primeiro momento, foram construídas com material extraído do local e por meio de mutirão. Depois, surgiram serrarias, diminuindo o trabalho individual. Encontrou-se também o emprego do sistema estrutural japonês em madeira, o kiyorogumi e o oriokigumi, com sambladuras de peças e o uso de cobertura em duas águas, chamada kiritsuma, simples e econômico. Mencionam-se os estudos de Teiji Itoh sobre a minka, até então não reconhecida como arquitetura. A técnica construtiva em terra e bambu era pouco difundida no Japão, sendo os saberes e ofícios a ela associados preservados em sistemas familiares análogos às guildas medievais. O uso do tsukichave, contudo, é milenar, tendo sido empregado em castelos e templos. O barro, mesclado com palha de arroz ou trigo, é fermentado por um período de até um ano, empregado em camadas sucessivas, até uma dezena, no acabamento. Nas misturas das camadas finais empregam-se aglomerantes e agregados como cal, areia, fibras vegetais e resinas a base de algas marinhas. O uso da terra foi recomendado em cartilhas aos imigrantes japoneses, durante a viagem, orientando-se a construção de casas salubres com uma técnica que já lhes era familiar. Houve adaptações no Brasil: em vez de bambus, foram usadas ripas de juçara; no lugar da corda shuronawa, o cipó local; para o preparo do barro, palha de arroz ou sapê; mais duas camadas de menor espessura após a consolidação da primeira camada e, por fim, a caiação. Nos primeiros exemplares estudados encontrou-se a unidade de medida shakkanhou, usada então no Japão e ainda empregada em sistemas tradicionais. Na ausência de desenhos, o desenvolvimento da planta dava-se num diálogo entre morador e carpinteiro, com as informações do projeto postas em ezuitga (pedaço de tábua) e com malha traçada a cada 3 shaku (30,3 cm), modulando o espaço. Em relatos, apareceram exemplos de casas desmontadas e remontadas.
MARICATO, Ermínia. Autoconstrução, a arquitetura possível. In: MARICATO, Ermínia (org). A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil industrial. São Paulo. Editora Alfa-Ômega, 2ª ed., 1982, p. 71-93.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Construção autogerida em meio urbano: espaços e técnicas
Dados sobre o autor(es) e obra:
Ermínia Terezinha Menon Maricato possui graduação (1971), mestrado (1977), doutorado (1984), livre docência (1997) pela Universidade de São Paulo, onde é também professora titular (1998) de Arquitetura e Urbanismo. Foi professora visitante do Center of Human Settlements da Universidade da British Columbia e da Witswaterand University de Johannesburg. Foi coordenadora do curso de Pós-Graduação e Presidente da Comissão de Pesquisa da FAUUSP, além de membro do Conselho de Pesquisa da USP e fundadora do LASB-HAB - Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos da FAUUSP. Foi Secretária de Habitação e Desenvolvimento Urbano do Município de São Paulo (1989-1992) e formulou a proposta de criação do Ministério das Cidades onde foi Ministra Adjunta (2003-2005). Recebeu vários prêmios e publicou vários livros sobre habitação e desenvolvimento urbano. O artigo em exame foi originalmente apresentado na 28ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em 1976, revisto parcialmente em 1978.
O artigo trata da produção da habitação e do assentamento popular no Brasil dos anos de 1970/80. O texto estabelece uma distinção importante entre os processos tradicionais de mutirão e ajuda mútua, reconhecidos como solidários, cooperativos e de base rural, e a “autoconstrução” habitacional nos grandes centros industriais. Se no campo, esses processos tenderam a desaparecer com a modernização, nas áreas metropolitanas adquirem cada vez mais importância como modo de produção da habitação da classe trabalhadora. Grande parte do artigo é dedicada à explicação das causas estruturais desse fenômeno, com base na análise marxista de articulação necessária entre exploração da força de trabalho e acumulação de capital. O conceito de autoconstrução proposto por Maricato designa o “processo de construção da casa (própria ou não)” por seus moradores que podem ser auxiliados por parentes, amigos, vizinhos ou por profissional remunerado (p. 74). Este processo se verificaria também na construção de igrejas, escolas primárias, creches e centros comunitários, estendendo-se ainda para o espaço urbano na forma de melhoria de ruas, calçadas, pontes, etc. Esta forma de produção habitacional ocorreria por falta de alternativa, correspondendo a “trabalho não pago” ou “supertrabalho” (apud Oliveira) e favorecendo a expansão capitalista. O tratamento da casa e do equipamento urbano como mercadorias, o salário baixo e os investimentos públicos ligados à dinamização econômica e à reprodução do capital estariam na raiz do problema e viabilizariam o desvio do orçamento público para outras finalidades e setores economicamente mais dinâmicos. A política do antigo Banco Nacional da Habitação (BNH) é evocada como exemplos desses desvios, mostrando-se que os agentes intermediários que recebem recursos do banco, retiram-se após produzir a habitação, e deixam a dívida e os problemas da construção para o trabalhador que conseguiu se inserir no sistema. A maioria, contudo, não consegue arcar com os custos dessa produção. A autoconstrução surge então como alternativa ou arquitetura possível, fomentando ainda o aparecimento das periferias urbanas. A casa autoconstruída é definida como um abrigo de alto valor de uso que contém o necessário para acolher a família e leva muitos anos para ser completada, o que impacta o seu estado de conservação. Como modo de produção, seria caracterizada pela articulação rígida de seus componentes, o que inviabilizaria qualquer manifestação inovadora no nível da técnica construtiva, dos materiais de construção ou das soluções formais. Identifica-se a preferência pelo bloco de concreto e pela laje pré-fabricada, devido ao seu baixo custo, mas as condições estritas do investimento popular tampouco permitiriam voos criadores, impulsionando uma padronização. O lote seria ainda um fator determinante do resultado, especialmente quando localizado em loteamentos clandestinos. Maricato conclui que a criação arquitetônica popular nesse contexto é uma ideia ingênua. Embora a análise se baseie em dados da Grande São Paulo, acredita que as conclusões desse estudo podem ser generalizadas para outras cidades, guardadas as especificidades vinculadas ao grau de industrialização.
LEMOS, Carlos e SAMPAIO, Maria Ruth Amaral de. “Evolução formal da casa popular paulistana”. São Paulo: FAUUSP, 1976.
_____________________. “A casa popular, mobiliário e aparelhos domésticos”. São Paulo: FAUUSP, Departamento de Projeto, Grupo de Disciplinas de Desenho Industrial, 1975.
Autor(es):
Carlos Lemos
Onde encontrar:
Acervo da Biblioteca da Faculdade de Arquitetura da UFBA.
Referência bibliográfica:
LEMOS, Carlos A. C. Cozinhas, etc. São Paulo: Editora Perspectiva. 1978.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Saberes tradicionais e espaço arquitetônico
Dados sobre o autor(es) e obra:
Carlos Lemos é arquiteto e artista plástico. Considerado um dos principais historiadores da arquitetura brasileiros, fez parte da primeira turma de estudantes de arquitetura da Universidade Mackenzie, em 1946, em fase anterior à criação da FAUUSP, graduando-se em 1950. Nos primeiros anos de sua atuação profissional, foi membro da equipe de desenvolvimento do projeto do Parque do Ibirapuera e, de 1952 a 1957, dirigiu o escritório de Oscar Niemeyer em São Paulo, tendo sido o responsável pela conclusão de uma das principais obras deste arquiteto nesta cidade: o edifício Copan. Atuando como professor e pesquisador do Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), também desempenhou papel de aguerrido defensor do patrimônio cultural brasileiro. Dentre suas outras obras publicadas, destacam-se os seguintes títulos: Arquitetura Brasileira (Editora Melhoramentos / EDUSP, 1987), História da Casa Brasileira (Editora Contexto, 1989), Alvenaria Burguesa(Editora Studio Nobel, 1989) e Casa paulista (Editora EDUSP, 1999). A obra em exame já teve várias edições, sendo a primeira de 1976 pela Editora Perspectiva.
Sumário obra:
Abreviaturas
Introdução
A Chaminé e a Fonte
O Pote, o Jirau e a Farinha
O Clima
Os Velhos Quintais e a Cozinha Antiga
A Varanda e o Açúcar
O Café e as Cidades
A Vida Urbana entre os dois Armistícios ou um Depoimento Pessoal
O Apartamento
A Habitação Popular, ou Melhor, a Casa Operária
Resumo Conclusivo
Bibliografia
Tabelas
Resumo :
Embora intitulado “Cozinhas, etc.”, Carlos Lemos deixa claro na Introdução a sua preocupação prioritária com a questão das moradias populares. Ou seja, a grande importância dada a um possível estudo da evolução histórica da moradia no Brasil, aqui, tem como objetivo a compreensão da “casa popular autêntica”, dentro do panorama da sociedade brasileira atual. Neste sentido, o autor vai buscar, inicialmente, definir o que seria efetivamente uma “casa popular ou operária”, entendo-a como aquela em que, diferentemente das habitações de outras classes sociais, encontra-se uma “superposição de quase todas as funções habitacionais”. Comentando acerca das dificuldades em desenvolver o estudo de modo aprofundado, abarcando toda a complexidade da realidade brasileira, o autor faz opção por apenas buscar entender “o que há de paulista na casa paulistana”. Ainda levando em conta a grande complexidade do campo da pesquisa, o autor também defende, como uma estratégia para o seu desenvolvimento, a opção de restringir ainda mais o seu campo de estudos, limitando-o à “análise das zonas de serviço de nossas casas e de suas funções principais, com respectivas superposições no espaço e consequentes implicações arquitetônicas”. No primeiro capitulo, intitulado “A Chaminé e a Fonte”, Lemos dedica-se a tecer considerações acerca das influências ibéricas e do seu processo de adaptação à realidade dos trópicos, particularizando no segundo capítulo – “O Pote, o Jirau e a Farinha” – as contribuições indígenas ao mesmo processo. Após abordar, no terceiro capítulo (O Clima), alguns aspectos relacionados às influências do clima nas lógicas de apropriação dos espaços da habitação tradicional, o autor, nos cinco capítulos subsequentes, toma como referências aspectos mais particulares da história e da realidade paulistas, dedicando-se a analisá-los quase que de modo cronológico: “Os Velhos Quintais e a Cozinha Antiga” (cap. 4), “A Varanda e o Açúcar” (cap. 5), “O Café e as Cidades” (cap. 6), “A Vida Urbana entre os dois Armistícios ou um Depoimento Pessoal” (cap.7) e “O Apartamento” (cap. 8). No capítulo 9 – “A Habitação Popular, ou Melhor, a Casa Operária” – Lemos volta a refletir acerca do conceito de “casa popular”, alertando para quão vago é o significado do adjetivo, propondo então a retomada da definição defendida por ele na Introdução. Agrega à característica que fundamenta a sua definição inicial de “casa popular” (superposição de funções), outras relacionadas à sua localização nas zonas urbanas e à sua distribuição no território, como também às técnicas e materiais construtivos utilizados. Registra o início da produção em grande escala de casas destinadas às camadas populares, à moradia dos trabalhadores urbanos, especialmente daqueles ligados à indústria. Faz algumas considerações acerca das mudanças implementadas no partido das pequenas casas dos arredores urbanos, ao longo da transição entre os séculos XIX e XX, registrando que algumas delas decorreram também da incorporação de influências da imigração italiana. Lemos diz que o advento do século XX chegou apresentando “duas soluções de casas operárias ou populares: a nacional, ou tradicional, e a nova do imigrante”. No capítulo 10 (Resumo Conclusivo), Lemos registra que – embora tenham sido várias as soluções de agenciamento das zonas de serviço nas habitações – em decorrência de aspectos tais como as variações climáticas, a diversidade de cenários e de poder aquisitivo, estas apresentavam soluções díspares: “ora a cozinha dentro de casa, outras vezes no quintal ou, então, a meio caminho, em puxado encostado à casa”. A partir daí busca explicar tal situação usando múltiplas justificativas de caráter histórico e cultural. Ao concluir faz considerações acerca da persistência da superposição de usos nas “casas modestas”, que o leva a questionar a validade do emprego do vocábulo “cozinha”, ironicamente admitindo o uso da expressão anglicizante “family room dos americanos para designar os locais de estar caseiro de nosso proletariado”. Finalizando, ao tratar da habitação burguesa, chama a atenção que, apesar da identificação das “determinantes da evolução formal por que passou a casa paulistana e a sua planta”, existe uma dinâmica que aponta lentamente para o desaparecimento de duas características ainda comuns: a questão da preocupação com as circulações, internas e externas e a segregação dos empregados nas dependências situadas nos fundos. “Fatalmente, um dia, a morada burguesa irá superpondo funções, até eliminar a cozinha, trocando o fogão pela mesa-quente aquecedora de comidas congeladas vindas dos supermercados”.