Acervo da Biblioteca da Faculdade de Arquitetura da UFBA
Referência bibliográfica:
GINDROZ, Raymond. Analisis del ordenamiento visual en los ambientes urbanos: lo monumental frente a lo popular. In LEWIS, Davis (org.). La Ciudad: problemas de diseño y estructura. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 1968.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Tecnologia tradicional no território e na edificação: vigências e usos contemporãneos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Raymond Leroy Gindroz (1940), americano de Nova Iorque, graduou-se em Arquitetura pelo Carnegie Institute of Technologye, em 1963, onde também obteve o mestrado em Arquitetura e Desenho Urbano em 1965. Foi um dos fundadores do Urban Design Associates, em 1966, e professor assistente do Departamento de Arquitetura da Universidade Yale (1968-1988) e continua a dar cursos especializados para universidades e fundações, como Prince's Foundation for the Built Environment, em Londres, Hampton University, na Virginia, e McGill University, em Montreal. É autor de dois livros sobre desenho urbano "The Urban Design Handbook (Norton Books, 2003) e The Architectural Pattern Book (Norton Books, 2005), além de diversos artigos como o comentado nesta ficha.
O trabalho baseia-se na premissa do ordenamento das estruturas visuais da urbe para fins de inteligibilidade, perguntando-se o quanto a mobilidade, social e física, do indivíduo depende da capacidade de interpretar o ambiente construído. Para tanto, o autor estabelece o binômio “popular/monumental”. O “popular” refere-se às estruturas criadas por indivíduos em sociedades não-especializadas, com métodos e formas tradicionais e para resolver problemas imediatos do abrigo. O “monumental”, por sua vez, seria típico de sociedades mais sofisticadas, onde um construtor-escultor especializado é o responsável por ambientes visuais representativos do poder da sociedade. Seriam, assim, opostos extremos na escala do ordenamento visual. A pesquisa, realizada com patrocínio da Fullbright Comission e com a colaboração do psicólogo e cinegrafista Jay Greenfield, produziu uma abundância de fotos, croquis e notações gráficas específicas e se deu em duas etapas. A primeira constou de um estudo do modo de percepção do trajeto e a segunda, da comprovação das análises por meio de entrevistas. No estudo do monumental, em torno da Piazza di San Pietro, contudo, apesar de observações acuradas, não há indicação do espectador em movimento. No das estruturas populares, por sua vez, não se examina a organização em larga escala, mas sim a agregação de refúgios individuais como produtos da necessidade imediata e do material disponível. Há um mínimo de ruas examinadas e o conjunto é labiríntico e impossível de se perceber de uma só vez. Os exemplos de povoados gregos e da Itália meridional mostram a rua como lugar de vida comunitária e mesmo de funções privativas das famílias, com transições complexas e ambíguas entre o público e o privado. Gindroz observa, contudo, que os dois extremos se relacionam. No medievo, registra-se a transformação do monumental em popular, a partir de castelos e templos, e se conhece a monumentalização de espaços populares, tanto com ampliações como pelo aproveitamento de alargamentos de ruas, onde o espaço é percebido. O estudo mais exaustivo dessa pesquisa se deu na comuna de Zagarolo, na Itália. Concluiu-se, a partir da análise do seu Corso (via principal), que o monumental pode não ser de imediata apreensão, mas configura-se no transcurso do tempo, pela sucessão de praças e edifícios. As entrevistas revelaram consenso nos elementos da estrutura visual do Corso, concluindo-se que, no espaço monumental, são estes que ordenam a percepção do indivíduo. No estudo das ruas transversais a este Corso – onde se vive mais do que se transita -, revelou-se que não houve problemas na identificação do espaço, mas essa preensão se deu por elementos distintos. O que definiria a estrutura popular, portanto, não seria sua pequena escala ou ainda a produção ou uso individualizados. Esta seria definida por sua percepção individualizada, onde, dentro de certos limites, o próprio indivíduo ordena a percepção do espaço.
Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro; Biblioteca Noronha Santos, IPHAN, Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro; Biblioteca Aloísio Magalhães, IPHAN, Brasília.
Acervo Profa. Marcia Sant’Anna.
Referência bibliográfica:
CAVALCANTI, Maria Laura. “Cultura e Saber do Povo: Uma Perspectiva Antropológica”. In: Revista Tempo Brasileiro, out.-dez. – n. 147 – 2001 – Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro Ed., p 69-78.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Dados sobre o autor(es) e obra:
Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti é Antropóloga, professora do Departamento de Antropologia Cultural e do Programa de Pós Graduação em Sociologia e Antropologia no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Graduada em História, pela Pontifícia Universidade Católica (1976), é mestre (1982) e doutora (1993) em antropologia pelo Museu Nacional/UFRJ. Como bolsista Fulbright, realizou Pós-doutoramento na Universidade de Columbia, Nova Iorque (1998/1999). Suas principais áreas de pesquisa são teoria antropológica, ritual e simbolismo, antropologia brasileira, cultura popular e estudos de folclore.
O artigo traz informações importantes do ponto de vista conceitual e metodológico sobre o universo da chamada “cultura popular”. Explicita uma perspectiva conceitual contemporânea para a abordagem desse universo, onde se destacam as seguintes idéias: 1) as noções de folclore e cultura popular fundamentam historicamente o sistema de classificação cultural vigente e, assim, sua definição nunca é indiscutível e seu conteúdo varia muito, sendo essa variação um indicador importante; 2) o discurso sobre o folclore e a cultura popular se inaugura quando se reconhece a distância entre modos de vida e saberes da elite e do “povo” – diferença que começa a ser valorizada no Romantismo do final do século XVIII em oposição ao ideal iluminista da razão universal e tomando a cultura popular como a “totalidade integrada da vida com o mundo” que teria sido rompida no mundo moderno; 3) na vida social, contudo, aspectos “modernos” e “tradicionais” encontram-se imbricados, superpostos e integrados em um só processo social e cultural; 4) a cultura popular interpreta as noções de tradicional e moderno dentro do seu universo de relações, estabelecendo distinções internas (mutáveis) que buscam controlar e refletir as mudanças sociais que estão em curso; 5) nas ciências humanas o modelo interpretativo elite x cultura popular está superado: a cultura é interpretada não por meio de fatos, mas de significados permanentemente atribuídos pelos homens e que atravessam as fronteiras entre as camadas sociais; 6) a cultura e o saber do povo, portanto, são heterogêneos e se relacionam com distintas formas de ser; são históricos e complexos e integram várias dimensões: oralidade e escrita, trabalho e lazer, comunitarismo e individualismo, cidade e campo, sagrado e profano, circuitos de troca monetarizados e/ou profissionalizantes, constituindo arenas onde se enfrentam distintos interesses e têm lugar distintos conflitos; 7) uma nova perspectiva conceitual para tratamento do campo não se concentra na demarcação das fronteiras e oposições entre erudito e popular, mas nas múltiplas maneiras por meio das quais diferentes níveis e aspectos culturais interagem na construção de um processo cultural; 8) a abordagem analítica contemporânea implica o reconhecimento de que os fatos da cultura são sempre “processos sociais totais” que envolvem e imbricam diferentes aspectos da realidade (econômicos, sociais, políticos, jurídicos, morais, artísticos, religiosos, etc.) e articulam em seu interior valores e interlocutores diferenciados, o que requer uma postura de suspensão de juízos de valor prévios e a consideração dos processos culturais populares a partir de seus próprios termos.
GUIMARAENS, Dinah & CAVALCANTI, Lauro. Arquitetura kitsch suburbana e rural. Rio de Janeiro: FUNARTE, 1979.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Construção autogerida em meio urbano: espaços e técnicas
Dados sobre o autor(es) e obra:
Dinah Tereza Papi de Guimaraens é Professora do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo e Professora Adjunta III do Departamento de Arquitetura da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense-UFF. Graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Santa Úrsula - USU (1978) fez extensão universitária em Semiótica Visual com o professor Umberto Eco (1979). Possui mestrado em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional - UFRJ (1992), mestrado em História Antiga e Medieval pelo Instituto de Filosofia e Ciências Sociais - UFRJ (1992), doutorado em Antropologia Social do Museu Nacional - UFRJ (1998) e pós-doutorado em Antropologia pela University of New Mexico (1999). É pesquisadora avançada do PROARQ (Programa de Pós-Graduação de Estudos em Museus) da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - FAU - UFRJ. Até março de 2009, foi professora da Faculdade de Comunicação Social da UNESA, integrando o Núcleo de Referência em Conservação e Restauração de Bens Culturais, o curso de Fotografia e sendo conteudista do curso virtual Estética e Arte Contemporânea da Universidade Estácio de Sá. Tem experiência em arquitetura e urbanismo; preservação e conservação de bens culturais nas áreas de cultura material e imaterial, artes visuais e objetos etnográficos; museologia e museografia; produção cultural; semiótica; antropologia cultural e estética; cultura indígena, afro-brasileira e popular, mídia digital e curadoria de artes plásticas. Além da obra objeto desta ficha, publicou, juntamente com Lauro Cavalcanti, Arquitetura de Motéis Cariocas: Espaço e Organização Social (1980, 2007), além de Museu de Artes e Origens: Mapa das Culturas Vivas Guaranis (2003).
Lauro Augusto de Paiva Cavalcanti é arquiteto, antropólogo e escritor. Escreveu vários livros sobre arquitetura, estética e sociedade e organizou diversas coletâneas sobre o assunto. É conselheiro da Casa Lucio Costa e da Fundação Oscar Niemeyer. Membro do conselho editorial do Iphan, é também diretor do Paço Imperial e professor da Escola Superior de Desenho Industrial (Esdi/Uerj). Possui graduação em Arquitetura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1979), mestrado em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1987) e doutorado em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1993). Atualmente é técnico em preservação cultural IV do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e professor adjunto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Teoria da Arquitetura, atuando principalmente nos seguintes temas: arquitetura moderna, arquitetura, artes plásticas e arte.
O livro trata do kitsch como um fenômeno cultural característico da transição de um código estético popular/vernacular/primitivo para outro mais oficial/tecnológico/erudito, decorrente da ascensão social de segmentos de média e baixa renda. Os autores também definem o fenômeno kitsch como a possibilidade de uma resposta antropofágica (no sentido oswaldiano do termo) das massas à cultura de elite, podendo, a partir dessa mescla e desse choque, surgir uma terceira realidade cultural. Nesta obra o kitsch é ainda tratado como produto de um processo semelhante ao que faz surgir vanguardas artísticas, sendo que estas colocariam mais ênfase no processo de criação e o kitsch, por sua vez, carregaria na reação emotiva. A relação com as vanguardas não se esgotaria, contudo, nessa semelhança etiológica, pois o kitsch seria também fornecedor de “estilemas” (elementos desencadeadores ou caracterizadores de linguagem ou expressão artística) para as vanguardas, já que ambos manteriam relação fundamental com a novidade. Os autores distinguem um kitsch passivo e um ativo. O passivo resultaria do consumo exacerbado de uma classe média em ascensão que colecionaria objetos industrializados que imitam os da elite, sem nenhuma intervenção ou personificação. Já o kitsch criativo resultaria do mencionado processo antropofágico de apropriação e reinterpretação de elementos da “cultura oficial”. Ao abordarem o kitsch como atitude criativa, que teria seu próprio código de estruturação do mundo e da sociedade, os autores assinalam que o fenômeno deve ser compreendido sempre em articulação com a estratificação social e com os processos culturais e econômicos próprios da sociedade pós Revolução Industrial. Assim, estaria ligado à elevação do consumo e também à crise da obra de arte como objeto único. A arquitetura kitsch é definida pelos autores também como uma arquitetura de transição entre uma arquitetura oficial e uma arquitetura de cunho popular. Dessa face popular, da autoconstrução e da espontaneidade, a arquitetura kitsch traria a inventividade na elaboração de espaços individualizados que transmitem a visão de mundo e a marca do seu criador. Manteria ainda o impulso e o instinto da concepção do abrigo próprio, inclusive como resposta às imposições tecnológicas, e a utilização de meios artesanais de produção mesmo numa realidade industrializada. Da arquitetura oficial, a arquitetura kitsch se apoderaria de elementos que adaptaria ao seu próprio repertório estético, como os da arquitetura moderna e os tecnologicamente sofisticados, “devolvendo-os” depois como outro produto estético que, eventualmente, pode revitalizar a arquitetura oficial por meio de sua potência de criação e de transgressão dos códigos da elite. A arquitetura kitsch, em decorrência do seu caráter de produto de afirmação social e de processo de personificação, exibe sempre um uso excessivo de materiais decorativos; a aplicação de processos construtivos sem o conhecimento de seus princípios; o uso variado e rico de materiais de construção; o uso excessivo da cor, empregada, geralmente, em tons berrantes e contrastantes; e grande diversidade em função do processo de personificação/individualização do espaço. O livro, que ilustrado com fotografias e croquis, se apoia em pesquisa realizada pelos autores na cidade do Rio de Janeiro e em alguns de seus subúrbios durante o ano de 1978.