O livro trata do kitsch como um fenômeno cultural característico da transição de um código estético popular/vernacular/primitivo para outro mais oficial/tecnológico/erudito, decorrente da ascensão social de segmentos de média e baixa renda. Os autores também definem o fenômeno kitsch como a possibilidade de uma resposta antropofágica (no sentido oswaldiano do termo) das massas à cultura de elite, podendo, a partir dessa mescla e desse choque, surgir uma terceira realidade cultural. Nesta obra o kitsch é ainda tratado como produto de um processo semelhante ao que faz surgir vanguardas artísticas, sendo que estas colocariam mais ênfase no processo de criação e o kitsch, por sua vez, carregaria na reação emotiva. A relação com as vanguardas não se esgotaria, contudo, nessa semelhança etiológica, pois o kitsch seria também fornecedor de “estilemas” (elementos desencadeadores ou caracterizadores de linguagem ou expressão artística) para as vanguardas, já que ambos manteriam relação fundamental com a novidade. Os autores distinguem um kitsch passivo e um ativo. O passivo resultaria do consumo exacerbado de uma classe média em ascensão que colecionaria objetos industrializados que imitam os da elite, sem nenhuma intervenção ou personificação. Já o kitsch criativo resultaria do mencionado processo antropofágico de apropriação e reinterpretação de elementos da “cultura oficial”. Ao abordarem o kitsch como atitude criativa, que teria seu próprio código de estruturação do mundo e da sociedade, os autores assinalam que o fenômeno deve ser compreendido sempre em articulação com a estratificação social e com os processos culturais e econômicos próprios da sociedade pós Revolução Industrial. Assim, estaria ligado à elevação do consumo e também à crise da obra de arte como objeto único. A arquitetura kitsch é definida pelos autores também como uma arquitetura de transição entre uma arquitetura oficial e uma arquitetura de cunho popular. Dessa face popular, da autoconstrução e da espontaneidade, a arquitetura kitsch traria a inventividade na elaboração de espaços individualizados que transmitem a visão de mundo e a marca do seu criador. Manteria ainda o impulso e o instinto da concepção do abrigo próprio, inclusive como resposta às imposições tecnológicas, e a utilização de meios artesanais de produção mesmo numa realidade industrializada. Da arquitetura oficial, a arquitetura kitsch se apoderaria de elementos que adaptaria ao seu próprio repertório estético, como os da arquitetura moderna e os tecnologicamente sofisticados, “devolvendo-os” depois como outro produto estético que, eventualmente, pode revitalizar a arquitetura oficial por meio de sua potência de criação e de transgressão dos códigos da elite. A arquitetura kitsch, em decorrência do seu caráter de produto de afirmação social e de processo de personificação, exibe sempre um uso excessivo de materiais decorativos; a aplicação de processos construtivos sem o conhecimento de seus princípios; o uso variado e rico de materiais de construção; o uso excessivo da cor, empregada, geralmente, em tons berrantes e contrastantes; e grande diversidade em função do processo de personificação/individualização do espaço. O livro, que ilustrado com fotografias e croquis, se apoia em pesquisa realizada pelos autores na cidade do Rio de Janeiro e em alguns de seus subúrbios durante o ano de 1978.