Não consta.
Hassan Fathy
Acervo da biblioteca da Faculdade de Arquitetura da UFBA.
Hassan Fathy (1900-1989) foi um arquiteto egípcio ímpar para sua época. Diplomado em 1926, com formação neoclássica, foi nomeado professor da Escola de Belas-Artes da Universidade do Cairo. Enquanto a maior parte dos seus colegas levava o olhar para os diversos movimentos modernistas e tentava introduzir, no Egito, estilos europeus, sozinho, Fathy tomou um rumo completamente diferente: procurou resgatar os antigos métodos de construção do país, com os materiais disponíveis e ao alcance dos pobres camponeses. Lançou a obra “Construindo com o povo: arquitetura para os pobres” em 1969 e, nesse mesmo ano, recebeu do governo do Egito o Prêmio Nacional de Artes e Letras. O livro foi publicado nos Estados Unidos em 1973 e no Brasil em 1980. Na época, a publicação teve grande impacto e uma repercussão significativa nos círculos acadêmicos. Quando publicado em francês, granjeou para Fathy o Prêmio de Literatura.
Informações retiradas do próprio livro e da publicação:
https://www.bibalex.org/Attachments/Publications/Files/hassan_fathy.pdf (acesso: 29/07/2015 às 11:42.)
Prefácio
1. Prelúdio: Sonho e Realidade
2. Coral: Homem, Sociedade e Tecnologia
3. Fuga: Arquiteto, Camponês e Burocrata
4. Final: Gurna Adormecida
Fathy inicia o livro relatando seu encontro com as formas tradicionais de construção em terra crua, e como nelas ele vislumbrou a solução para o problema habitacional do homem do campo no Egito. Acreditando no potencial desse método construtivo e na necessidade de reconhecimento desse saber milenar, tanto com o intuito de salvaguardar um patrimônio cultural quanto o de valorizar aqueles que o usufruem e que são marginalizados frente aos avanços tecnológicos, buscou desenvolver habitações que fizessem uso dessa técnica e que fossem acessíveis à população de baixa renda, satisfazendo três parâmetros: técnico, material e econômico. A priori desenvolveu habitações em que a terra crua, na forma de adobe, era empregada somente nas paredes. Verificou que essas construções não ficavam muito mais baratas do que aquelas feitas com materiais convencionais, isso porque a madeira utilizada no telhado encarecia a obra. Essas primeiras tentativas o fizeram perceber que, para alcançar seu ideal de desenvolver habitações voltadas para a camada humilde da população, era necessário que toda a construção fizesse uso da terra crua como matéria prima. Portanto, interessado em realizar edificações que fossem inteiramente desse material, resgatou, na Núbia, uma técnica de construção de abóbadas de fácil execução. O resgate dessa técnica entre os núbios foi de suma importância para o trabalho de Fathy pelo fato de dispensar o uso de formas na confecção das arcadas, o que barateava o processo e tornava-o tecnicamente mais simples. Assim, esse conhecimento garantiu viabilidade ao seu ideal de aliar, em uma construção, acessibilidade técnica e material, baixo custo, e saber tradicional. Além do interesse em solucionar o problema habitacional da zona rural, Fathy tinha a intenção de difundir esse saber entre os arquitetos, uma vez que o tema parecia ser ignorado pela própria academia, e de descontruir a ideia de que o adobe está relacionado apenas às habitações precárias das populações de baixa renda. Após essa introdução, a obra descreve a experiência que o autor teve de projetar e construir uma aldeia toda em terra crua. Nova Gurna surgiu de um convite feito ao arquiteto pelo Departamento de Antiguidades Egípcio a partir da necessidade de desapropriar uma população de 7.000 habitantes que vivia em cima das tumbas do antigo cemitério de Tebas, em uma zona considerada Patrimônio Mundial pela UNESCO. Essa descrição se dá em duas partes. A primeira é dedicada a descrever e explicar todas as decisões projetuais. A segunda, a abordar as estratégias de ação para execução da nova aldeia e os empecilhos que foram vivenciados durante a sua realização, que resultaram no “fracasso” do projeto. A abordagem de Nova Gurna se inicia com a discussão acerca da situação atual da arquitetura egípcia e como o projeto se posicionava diante desse quadro. Fathy estava em desacordo com a tradição arquitetônica contemporânea do Egito, que alegava carecer de um estilo e ser fruto de importação, defendendo que a verdadeira arquitetura não consegue existir fora de uma tradição viva. Carregava consigo o desejo de superar, nesse projeto, o abismo que separa arquitetura popular daquela feita por profissionais, acreditando que o arquiteto goza de uma situação ímpar para reascender a fé do camponês na sua própria cultura. Também critica o pedantismo que permeia sua profissão, ressaltando a importância do diálogo entre arquiteto, proprietário e artesão, acreditando que eles constituem uma trindade. Fathy relata ter buscado inspiração nas formas dotadas de originalidade e espontaneidade da antiga aldeia e as ter incorporado à nova, não com um sentimento de saudosismo, mas com o objetivo de restituir aos gurnenses suas criações. Além da atenção com as antigas formas locais, se preocupou em desenhar a nova aldeia respeitando a estrutura de parentesco e costumes dos gurnenses, e em conhecer o modo como eles se relacionavam com o morar. Outra grande preocupação de Fathy era quanto às questões econômicas da aldeia, visto que a economia da comunidade dependia quase que exclusivamente de roubos aos túmulos, motivo pelo qual sofreram a expropriação. Mesmo não tendo sido solicitado, Fathy incorporou como parte vital do projeto ampliar as fontes de recursos da população, dando-lhes ocupações que rendessem, informando ao leitor tais considerações e as soluções levantadas. Além dessas questões, Fathy trata de explicar separadamente cada uma das construções planejadas para a aldeia (desde os edifícios públicos e espaços comunitários à casa do camponês) e como se daria a questão da mão-de-obra. Nesse momento Fathy aborda sua crença no sistema de mutirão para zona rural e como se deu o treinamento do serviço em Nova Gurna. Após explicar todo o projeto, Fathy se dedica a pensar essa experiência dentro de um âmbito maior, como um Programa Nacional para a Reconstrução Rural, pois, para ele, Nova Gurna não era um fim em si mesma, mas sim um primeiro passo no caminho para a regeneração da zona rural e um conceito de habitação completamente novo. Para falar das obras de construção da nova aldeia, divide a experiência em três estações, onde cada uma corresponde a um período de um ano, que vai de 1945 a 1948. Segundo ele, esse momento do livro é uma tentativa de fazer o leitor entender o fatídico desdobramento do projeto. Fathy deixa subentender que o insucesso se deu pela incompletude das obras, tendo como causa principal as dificuldades enfrentadas de ordem burocrática, mas também relata a resistência da população quanto à sua relocação, o que culminou na tentativa de sabotagem das obras, e a epidemia de cólera que afetou a aldeia. Por fim, o último aspecto tratado no livro corresponde às expectativas do autor, após o “fracasso” de Nova Gurna, com respeito a esse método construtivo e ao seu poder como ferramenta de transformação social. Fathy registra seu desejo de, no futuro, trabalhar aplicando os princípios da construção em mutirão e desenvolvendo as ideias esboçadas ao longo do livro numa cidadezinha provinciana de Nabaroh, no Egito, onde se deu a infância de sua mãe. A obra é ilustrada com algumas fotografias.
Estudante bolsista: Camila Contreras Novaes
Márcia Sant’Anna