Não se aplica
Maria Estela Ramos
Biblioteca da Faculdade de Arquitetura da UFBA;
https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/11986?mode=full
RAMOS, Maria Estela R. Território afrodescendente: Leitura de cidade através do bairro da Liberdade, Salvador (Bahia), 2007. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo). Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Universidade Federal da Bahia, Salvador.
Maria Estela Ramos possui Graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Espírito Santo, em 1995, Mestrado e Doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Bahia [PP-GAU FAU-UFBA], em 2007 e em 2013, respectivamente. Dispõe de experiência profissional na área de projetos de arquitetura, projetos comunitários com técnicas construtivas tradicionais, tecnologias sociais e assistência técnica em autoconstrução. É pesquisadora na temática de espacialidades e patrimônios culturais de comunidades negras urbanas e rurais, atuando principalmente nos seguintes temas: arquitetura, culturas negras e bairros negros. Atua como arquiteta e professora nos cursos de Arquitetura e Urbanismo e Design de Interiores na Unime-Lauro de Freitas, orientadora de iniciação científica e coordenadora do Escritório Modelo de Arquitetura e Interesse Social EMAIS [E+].
Informações obtidas em: http://lattes.cnpq.br/3100513551876982
INTRODUÇÃO
Contextualização da Pesquisa
A Identificação do Problema e Objetivos da Pesquisa
Delimitação da Pesquisa e Organização do texto
CAP. 1 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA
Referencial Teórico e Metodologia
Fontes Documentais
CAP. 2 - UMA CRÍTICA À PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO
As representações sociais
Exposição dos conceitos utilizados
CAP. 3 - BREVES REFLEXÕES SOBRE A ARQUITETURA E URBANISMO NO BRASIL
A identidade étnica como componente das relações sociais e espaciais
Contornos da exclusão urbanística
Espaço urbano e habitação: outras formas
CAP. 4 - O BAIRRO DA LIBERDADE COMO TERRITÓRIO AFRODESCENDENTE
Breve histórico do bairro da Liberdade
As representações sociais do bairro da Liberdade
A percepção do bairro
A percepção da cultura
Leitura de cidade através do bairro da Liberdade
A dissertação tem como objetivo analisar como a cultura afrodescendente influenciou no processo de autoconstrução urbanística e segregação socioespacial em localidades denominadas como “bairros negros”. A autora focaliza os estudos em um bairro hegemonicamente negro da cidade de Salvador, a Liberdade, sob a ótica das histórias de moradores e representantes sociais, buscando compreender como os aspectos estéticos e os hábitos da cultura de matriz africana deste local influenciaram na produção dos espaços urbanos. Buscam-se relatos de vivências que remontam às décadas de 1920 e 1930, período em que ainda não haviam ocorrido as invasões de terrenos que elevaram exponencialmente o índice populacional do bairro. O primeiro capítulo discorre sobre o método utilizado na pesquisa, apontando os principais referenciais teóricos e as fontes documentais consultadas e apresentando material cartográfico do bairro. No segundo capítulo a autora apresenta os princípios sociais de raiz africana que podem ser associados à afro descendência brasileira. Sendo estes princípios apontados não eurocêntricos, a autora, neste capítulo, também argumenta sobre a produção de conhecimento não-hegemônica no campo da pesquisa urbana. O terceiro capítulo aponta como a etnicidade pode ser fator influenciador das relações sociais e espaciais, colaborando para o processo de segregação espacial no meio urbano . Por fim, o quarto capítulo discorre sobre o bairro da Liberdade, principal espaço de investigação, buscando compreender a formação deste bairro, a espacialidade construída a partir dos referenciais afro descendentes e o modo como o bairro é compreendido pela cidade. Nota-se que, para além da discussão teórica apresentada inicialmente, o foco de interesse deste Guia de Fontes encontra-se a partir do terceiro tópico do Capítulo 3 e no Capítulo, já que estes delineiam o histórico da formação do bairro, com foco na construção autogerida e destacam pontos de influência da cultura de matriz africana no processo de formação espacial e urbana. Deste modo, a autora inicia esta parte descrevendo algumas características comuns nas tipologias de ocupação e construção de aldeias africanas tradicionais, destacando sua autoconstrução e organização espacial. O Kraal (exemplo de aldeia apresentado no texto, ilustrado com imagens, mas localizado regionalmente no continente africano) contém casas próximas entre si, normalmente pertencentes a pessoas com laços de parentesco, que criam áreas externas onde costuma-se passar a maior parte do tempo desenvolvendo atividades rotineiras e de lazer. A área interna da casa serve também como espaço de armazenamento de alimentos e ferramentas, assim como abrigo para descanso. Os materiais utilizados na construção das casas são o barro, a madeira e a palha, com técnica semelhante ao que se conhece na Bahia como taipa de sopapo. Em seguida, o Capítulo 4 inicia com a contextualização do Bairro da Liberdade, apresentando seu histórico de ocupações ao longo do tempo. O bairro surge no século XVIII, a partir da antiga “Estrada das Boiadas” (hoje Avenida Lima e Silva). Moradores também apontam a existência de alguns quilombos, no final do século XIX, espalhados pelo perímetro do bairro, que, ao longo do tempo, tornaram-se assentamentos informais. A partir da década de 1940, a área recebe muitos migrantes da própria cidade quanto do interior que encontravam facilidade de assentarem-se nesse local. As representações sociais, movimentos culturais e os próprios moradores figuram como agentes importantes na estruturação do bairro, tendo em vista o grande descaso do governo com relação a investimentos básicos nas áreas periféricas. Os moradores informam que, por vezes, realizaram as obras necessárias para garantir o desenvolvimento local. A historicidade apresentada no processo ocupacional da Liberdade, demonstra a sobreposição de tipologias, residenciais e urbanas, que produziram área distintas entre si, tanto fisicamente quanto social e simbolicamente. Fotos apresentadas no texto ilustram esta sobreposição, demonstrando que em áreas tradicionais existem desde igrejas do século XVIII e sobrados coloniais, a prédios contemporâneos comerciais e/ou multifamiliares. No âmbito das residências, notam-se construções do fim do século XIX, que a autora aponta como sendo pertencentes a uma tipologia que denomina de “estilística popular”, além de identificar diversas tipologias do século XX, como o chalé, as “casas de Platibanda” e a autoconstrução. Esta normalmente ocorre nas invasões localizadas em “brongos” ou “quebradas”, ou seja, em áreas íngremes de difícil acesso. A técnica construtiva mais antiga encontrada nas edificações foi a taipa de sopapo, que depoimentos descrevem como um método popular, mas também como um festejo onde vizinhos se uniam para colaborar com as construções uns dos outros. Logo após ser colocada a taipa, a casa era coberta com palha até que o morador conseguisse recursos para cobri-la com telha cerâmica. Outro material utilizado era o adobe, comum nas construções africanas, técnica passada por gerações conforme afirmam os depoimentos. Porém, ao longo do tempo, tanto taipa quanto adobe foram sendo substituídos pelo tijolo cerâmico na construção das “casas de platibanda”, que substituíram os chalés, e que, aos poucos, foram sendo verticalizadas, tipologia que, atualmente, é a mais encontrada no bairro. O parcelamento informal das terras caracteriza as primeiras formas de expansão do bairro, acontecendo normalmente entre grupos familiares. Moradores relatam que devido a este tipo de desmembramento, os lotes, por vezes, eram apenas limitados por cercas-vivas ou não havia nenhuma delimitação, o que criava ambientes permeáveis que estimulavam à socialização entre vizinhança. Uma tipologia urbana comum do bairro são as “Avenidas”, fileiras de casas que normalmente pertenceram a um único lote desmembrado, possuindo acessos tanto por “becos” (passagem lateral) quanto diretos a partir da rua. Esta agregação social familiar nesta forma de auto-organização urbana, assemelha-se, segundo a autora, à modulação espacial do Kraal, onde a rua é extensão da casa, sendo utilizada tanto como espaço de lazer e socialização quanto de trabalho (exemplo disto, são as feiras). A ocupação informal e de perfil familiar é consequência da pouca ação estatal sobre o bairro, onde a socialização é fator determinante no desenvolvimento desta população negra, considerada ponto crucial tanto na evolução ocupacional física e estrutural do bairro, quanto no “fazer urbano” sócio cultural. Desta forma, para além dos pontos físicos em comum da construção e organização urbana africana, a autora define a Liberdade como um bairro Afrodescendente, por ter sido um espaço construído paralelamente ao tecido urbano formal, por uma população majoritariamente negra que encontra neste “local seguro” uma possibilidade de se abrigar e se desenvolver. Assim estes moradores carregaram consigo uma forma de sociabilidade e resistência muito característica de sua descendência, fator que facilita o processo de criação destes territórios negros nas cidades.
Zara Rodrigues
Marcia Sant’Anna