CARVALHO, Solange Araujo de. Avaliação da Aplicabilidade do Conceito de Habitabilidade nas Moradias das Favelas Cariocas – O Caso de Vila Canoas. Dissertação (mestrado) – Programa de Pós-graduação em Arquitetura, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2008.
Eixos de análise abordados:
Conceitos e métodos
Construção autogerida em meio urbano: espaços e técnicas
Dados sobre o autor(es) e obra:
Solange de Carvalho possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1993), mestrado pela mesma universidade (2008), focalizando Habitação de Interesse Social. Atualmente é doutoranda na UFRJ (2016), desenvolvendo pesquisa sobre os Desafios e Limites do Projeto Urbano em Favelas. É Professora Assistente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ.
INTRODUÇÃO 1. CAPÍTULO I - AS FAVELAS NO RIO DE JANEIRO 2. CAPÍTULO II - CONCEITOS DE MORADIA SUSTENTÁVEL E CRITÉRIOS DE HABITAÇÃO ADEQUADA 3. CAPÍTULO III – A REALIDADE CONSTRUÍDA NAS FAVELAS CARIOCAS: O CASO DE VILA CANOAS RECOMENDAÇÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANEXOS
Resumo :
A tese em questão avalia o conceito de habitabilidade nas moradias das favelas cariocas, com base no crescimento exacerbado dos assentamentos informais no Rio de Janeiro. A pesquisa foi realizada a partir de 19 casas nas favelas de Vila Canoas e Pedra Bonita, baseada no contexto histórico da ocupação, nas intervenções de programas do governo e nos índices de habitabilidade que são aplicáveis às favelas, mas que não seriam à cidade formal. No primeiro capítulo, a autora afirma que os assentamentos informais se iniciaram a partir do desequilíbrio do crescimento demográfico e do processo lento de construção de novas moradias. Além disso, apresenta as políticas públicas que foram implementadas no Rio de Janeiro ao longo dos anos. Uma das mais importante foi o Programa Favela Bairro, que visava transformar os assentamentos informais em novos bairros, possibilitando sua integração à cidade formal. Porém, o programa se restringia às áreas públicas e a remoções de edificações de alto risco, sem proposta de intervenção nas moradias. Já as favelas de Pedra Bonita e de Vilas Canoas foram o projeto piloto do programa Bairrinho que surgiu em 1997. A autora conclui este capítulo com um panorama sobre as habitações nas favelas cariocas, ressaltando como moradias não seguem os parâmetros estabelecidos pelo Código de Obras, são produzidas sem mão de obra qualificada ou assessoria técnica. O caráter transitório das favelas, marcado pelos barracos de madeira, está sendo perdido e substituído por casas de alvenaria, com estrutura de concreto armado, divisórias de tijolo cerâmico e pouco revestimento externo. Além dessas características, autora aponta a utilização da última laje como área de secagem de roupa e de lazer, e, nos casos em que existe telhado, o uso de telhas de fibrocimento. As favelas muito adensadas, com becos e muito verticalizadas, tendem a ter os níveis inferiores com grande dificuldade de ventilação e iluminação naturais, o que torna esses ambientes insalubres. A laje do último pavimento e o subsolo podem ter um valor de venda para construção de novas moradias, para aluguel ou para ampliação da família. Segundo Carvalho, os desejos dos moradores estão principalmente relacionados à expansão da moradia, seja horizontalmente ou verticalmente, pois o tamanho é considerado um dos principais atributos da casa. No segundo capítulo, a autora explora alguns conceitos, como o de “habitação saudável”, correspondente àquela que apresenta condições de saneamento básico e higiene, diminuindo o contato dos moradores com doenças. O segundo conceito explorado é o de “habitação confortável” que está relacionado à funcionalidade e acessibilidade da moradia. O último conceito trabalhado é o de “habitação sustentável”, que está relacionado à garantia de conforto e proteção dos usuários, considerando os novos parâmetros de consumo de água e energia, além de prever a utilização de materiais não poluentes. No terceiro capítulo, a autora apresenta os procedimentos metodológicos para abordar o seu estudo de caso. Os principais critérios adotados para a escolha da favela a ser estudada foram: ser consolidada e ter feito parte um programa do governo para urbanização de favelas; ter grande parte das moradias atendendo aos critérios de regularização edilícia do município e ser de pequeno porte e fácil acesso. Já para a escolha das casas a serem analisadas na favela selecionada, foram consideradas as que estivessem aptas à regularização. Alguns outros aspectos foram também analisados, como área interna da moradia, padrão de acabamento e localização. Com base nesses critérios, foram selecionadas 17 casas na favela de Vila Canoas e duas casas na favela de Pedra Bonita, ambas em São Conrado, Rio de Janeiro. As favelas em estudo são próximas, porém Pedra Bonita surgiu primeiro, em uma parte do terreno de um clube de Golfe, próxima ao rio Canoas, que seria uma área destinada aos trabalhadores deste clube para construção de moradias próximas ao trabalho. Mas quando eram demitidos tinham que desocupar o local e, sem perspectivas de uma nova moradia, começaram a ocupar de forma desordenada uma parte mais íngreme do terreno do clube, ao sul de Pedra Bonita, dando origem à favela Vila Canoas. O Programa Bairrinho proporcionou algumas melhorias nesta favela, como a urbanização das suas duas praças, a construção de uma creche e do posto de saúde e a revitalização do rio. Porém, a proposta de desadensamento desta favela, que incluía realocação de alguns barracos precários, não foi adiante e não houve intervenções nas moradias. Já o Projeto Bela Favela, surgiu como uma demanda dos próprios moradores do entorno da praça São Paulo, em Vila Canoas, para melhorar as fachadas de suas casas, pois sentiam que estavam inacabadas e davam um aspecto de degradado à favela recém urbanizada. Com relação aos aspectos urbanísticos, a autora realiza uma análise do padrão morfológico das áreas estudadas, comparando-os com o da cidade formal, cujas casas são isoladas no centro dos lotes. Em Pedra Bonita, as edificações são geminadas e em Vila Canoas, prevalece a desordem, sem delimitação de lotes e com a formação de grandes aglomerados de casas. Outras características desta favela são abordadas, como o fato de se desenvolver em terreno íngreme e de muitas casas terem pavimentos abaixo do nível da rua. Além disso, a ausência de vegetação no entorno, em contraste com Pedra Bonita que está próxima da mata. Vila Canoas é ainda margeada por duas ruas do bairro formal, porém o seu sistema viário interno é marcado por becos e escadas estreitas, o que faz com que, em alguns pontos, a iluminação natural seja insuficiente até durante o dia. Segundo a autora, a dificuldade de acessibilidade é uma das reclamações dos moradores mais idosos. Em relação aos aspectos habitacionais, é um ambiente predominantemente residencial, com edificações multifamiliares, de um a cinco pavimentos. Geralmente o subsolo é a ultima parte a ser ocupada, por questões de salubridade. Segundo entrevistados de Vila Canoas, as casas da favela têm em torno de 40 m² e são consideradas as melhores casas as que têm maior espaço interno e bom padrão de acabamento. A localização também é valorizada, pois, apesar de as casas nas ruas principais facilitarem a acessibilidade, as demais no meio da favela são consideradas mais silenciosas. O tijolo cerâmico furado é bastante utilizado nas paredes divisórias das casas e o concreto armado nas estruturas. Segundo Carvalho, o concreto produzido não tem controle de qualidade rígido, sendo possível encontrar diversas patologias nas casas, como armaduras aparentes, infiltrações e insalubridade, que, segundo os moradores, são sinais de precariedade da habitação. Além disso, a maior parte das casas tem a fachada principal revestida, porém as outras estão com elementos de vedação expostos às intempéries. A autora também faz uma análise dos moradores da favela, em relação à origem, ao grau de alfabetização, à idade, à renda e à saúde da população. Nos resultados da pesquisa, Carvalho apresenta alguns relatos de moradores e dados avaliados, como o da maior parte dos entrevistados sempre ter morado no mesmo local, porém começaram em barracos de madeira e hoje já habitam casas de alvenaria e que nem todos fizeram as melhorias com as próprias mãos. Alguns moradores fizeram a reforma enquanto estavam dentro da casa, outros conseguiram morar de aluguel em outro local. Analisando as patologias construtivas, muitos casos estão relacionados a infiltrações de casas vizinhas e os reparos acabam sendo feitos, na maioria, pelo morador prejudicado. Com relação ao conforto, foi analisado que iluminação e ventilação naturais são uma das maiores dificuldade das casas, principalmente pela proximidade com casas vizinhas, o que gera ainda falta de privacidade e sossego. O pé direito das casas, em grande parte, está abaixo de 2,60 m, o que seria o aceito pela norma. Já as casas de Pedra Bonita são consideradas referências de qualidade habitacional pelos moradores de Vila Canoas, principalmente serem espaçosas e por causas da proximidade com a mata. A autora afirma que a maioria dos entrevistados de Vila Canoas está satisfeita com sua moradia, pela tranquilidade do local, acesso à serviços públicos, proximidade da cidade formal, porém a sujeira dos becos incomoda. Carvalho levanta alguns questionamentos em relação às moradias visitadas, pois estas casas, atualmente, estariam aptas à regularização, porém com condições precárias de iluminação e ventilação, o que exigiria do morador investimentos, incluindo demolições, que dificilmente seriam aceitas por eles sem interferência do poder público. Ao longo do texto algumas propostas de intervenções são apresentadas mediante plantas baixas. A autora conclui que a urbanização trouxe benefícios para as favelas, mas ainda existem muitos aspectos a serem melhorados, principalmente relacionado às moradias e reafirma a importância do arquiteto e urbanista na definição dos critérios de habitabilidade mínima para que, no processo de regularização, ocorra a melhoria efetiva das casas nas favelas recém urbanizadas.