O autor dedica-se nesta obra a construir uma teoria sobre movimentos sociais urbanos com base na etnografia de três movimentos dessa natureza ocorridos no Rio de Janeiro, entre os anos 1960 e 1970, em consequência de programas de erradicação de favelas e de renovação urbana. Debate, ainda, e desconstrói, com base nessas experiências, o conceito apresentado por Manuel Castells, no livro Movimientos Sociales Urbanos (Madrid: Siglo Veintiuno Eds, 1974) e o “mito”, então corrente, da existência de “comunidades faveladas”. Aponta o caráter transitório e derivado de momentos de crise que fundamenta a ação coletiva dos favelados e sua integração, em nível individual e coletivo, à lógica capitalista que preside a produção do espaço urbano, inclusive no que toca à apropriação de seus símbolos arquitetônicos e urbanísticos de status, por ocasião da implementação de planos de reurbanização. Assim, o tema da arquitetura e do assentamento popular não são os focos principais dessa obra, embora informações interessantes a esse respeito surjam no bojo dos trabalhos de campo desenvolvimentos nas três localidades examinadas: a favela de Brás de Pina, próxima à Av. Brasil; a favela do Morro Azul, no Flamengo, e o bairro do Catumbi, próximo ao centro da cidade. Essas informações encontram-se principalmente nos capítulos relativos a Brás de Pina e Morro Azul e tratam da história dessas ocupações, sua formação inicial e desenvolvimento dos espaços dos “barracos” – que ainda predominavam nas favelas cariocas – e do surgimento de uma arquitetura popular em alvenaria no âmbito dos planos de urbanização implementados ou idealizados. Sobre Brás de Pina, o autor assinala o esforço dos moradores na construção do terreno do assentamento, a partir do aterramento progressivo de uma área pantanosa. Assinala que as melhores casas e os espaços com melhor infraestrutura localizavam-se nas áreas ocupadas a mais tempo, mas sem relação direta com a renda dos moradores. Composto basicamente de barracos de madeira, muitos dos quais sobre palafitas, o assentamento possuía algumas ruas retilíneas e largas como prolongamentos de outras do bairro vizinho, sendo as demais, becos tortuosos que, na maioria, constituíam vias sem saída. A experiência de Brás de Pina adquiriu notoriedade por ter sido a primeira a advogar e realizar um plano de reurbanização, em reação à então vigente política de remoção. Foi conduzida, apesar dos problemas e contradições surgidos, de modo a promover a participação dos moradores, admitindo-se “padrões não convencionais para os materiais e espaços de moradia”, o que permitiu que os habitantes desenhassem ou escolhessem o desenho de suas casas nos novos lotes delimitados. Contudo, não eram obrigados a construí-las por ocasião da transferência para os novos lotes, mas apenas um banheiro ligado à rede de esgoto, podendo-se remontar os barracos no fundo, deixando-se a frente do lote livre para a nova construção. O autor aponta como traços principais das casas desenhadas ou escolhidas pelos moradores, a divisão em sala, cozinha, banheiro, área de serviço e dois quartos e a proposição de pequenas varandas e corredores – elementos, em geral, inexistentes nos barracos. Conclui que havia nas casas desenhadas pelos moradores uma tendência de “imitar” apartamentos cujas plantas são anunciadas nos jornais, incorporando-se também seus signos de status. O autor assinala ainda o surgimento, na implementação do plano de urbanização, de ações especulativas como a venda de “direitos” de permanência por parte de moradores que não tinham condições de construir, além da construção de espaços para aluguel. Com isso, ressalta a lógica capitalista de produção do espaço que também ocorre nesses casos, advogando que, ao invés de serem contidos ou ignorados, se busque aprender com eles. O assentamento de Morro Azul, por sua vez, é descrito como um “típico aglomerado irregular de moradia em encosta”, formado majoritariamente por barracos de madeira construídos em torno de becos íngremes. Embora numa escala muito menor do que em Brás de Pina, no Morro Azul a maioria dos moradores optou por construir suas casas segundo seus próprios desenhos, mas aí também não houve muita divergência entre estes e os resultantes de apoio técnico especializado. Devido à declividade do terreno, houve o aproveitamento do desnível para um porão ou cômodo de aluguel, mas o modelo de casa com sala, dois quartos, corredor, banheiro e cozinha foi o predominante. O autor classifica essas plantas como “racionalistas” e relacionadas às formas correntes de morar na cidade, o que também poderia ser dito sobre as casas de Brás de Pina. Estabelece uma comparação entre essas casas e os barracos existentes em Morro Azul, os quais tinham dimensões entre 4 e 35 m2 e divisões internas muito variadas, sendo o cômodo mais constante a cozinha. Nos casos em que existiam, os quartos eram mínimos e o corredor foi detectado em apenas um barraco. Os interiores desses barracos são descritos como atravancados, com móveis utilizados como divisórias, e circulação interna feita por cima deles ou a partir do recolhimento de camas e colchões durante o dia. Para o autor, a presença de sala e corredor constituiria um traço distintivo entre barraco e casa de alvenaria. No relato dessas experiências de urbanização, o autor questiona a prática do mutirão, observando que, sempre que possível, os moradores contrataram os serviços de construção, dedicando-se pessoalmente a ela apenas no fim de semana. O livro é ilustrado com desenhos e fotografias dos assentamentos comentados.